Nosso colaborador Joza Novalis está de volta ao Ninho para escrever opções de reforços estrangeiros para a posição de volante - uma das mais carentes ainda da equipe.
Confira:
Perspectivas para o Flamengo em 2019 são as melhores possíveis, ao menos em tese, sempre bom pontuar, quando se trata do Mengão. Nas temporadas anteriores, da gestão passada, reforços chegaram e garotos da base foram promovidos ao time principal. Roteiro correto e elogiável não fosse por um detalhe: nas arquibancadas, vez ou outra, muitos tinham a sensação de que faltava um lateral. Ou dois. Só um exemplo. Sem coçar muito a cabeça, qualquer torcedor acha outros.
Nome de quem veste a camisa do Fla e manda no segundo terço do campo? Quem sabe? Cuéllar. E quem pode ser o seu vizinho, companheiro no setor, em 2019? Arão. Pode reclamar, pode xingar. Mas vai lá falar com o Abelão. Ao menos é o que tudo indica. Mas se ele não aprovar as atuações do Arão, vai bancar o Jean Lucas? Poderia ser uma boa, mas pouco provável.
E o Piris? Esqueça! Paraguaio é primeiro volante com boa recuperação, mas não tem perfil de garçom. Além disso, prática de ser camisa 5 e circular por outros setores do campo com intimidade é para poucos. É para Cuéllar, não é para Piris. Possível, portanto, que especulações sobre a busca de um volante pipoquem nas redes sociais muito em breve. E qual seria o volante ideal para o Fla, nos demais mercados da América Latina?
O que faz ou o que deveria fazer um bom volante
A redução dos espaços em tese não funciona somente como arma para encaixotar o ataque rival numa marcação bem posicionada. Ela é vital também para as transições rápidas de uma equipe que se pretenda protagonista numa partida. Para tanto, a presença de jogadores habilidosos e que participem da construção ofensiva ainda no segundo terço é vital, pois a maioria dessas ações ocorrem justo neste setor, o segundo terço. Daí a importância dos técnicos acordarem à necessidade de volantes que vão além da brava capacidade de lutar. E na boa: lutar é obrigação, embora muitas vezes tanto jogadores como a torcida na arquibancada se esqueçam disso. Aquele negócio de dar carrinho, sujar o calção, cerrar o punho e ainda gritar na cara do rival é de fato contagiante. Mas é prática obsoleta e que deve ficar no passado. Ao menos no que se trata das necessidade de uma equipe de porte, como a do Flamengo.
Bom posicionamento substitui inúmeras ações empolgantes no futebol. Isto serve para goleiros, centroavantes e também para os volantes. Ideia é ter garra e destemido espirito de luta, mas sem sujar o calção. Difícil? Sim! É por isso é que prevalece o habilidoso em dar carrinhos. "Ah, mais eu gosto de ver essas ações nos jogadores do meu time?". Seu time é pequeno? Okay. Não é? Então pensemos o quanto ele tem se confundido como o Americano de Campos, Nova Iguaçu ou Goytacaz?
Amenizando: tem problema nenhum dar carrinho. Um ou outro. E só. Excesso num jogador pode ser problema sério de posicionamento. Prática disseminada numa equipe grande escancara problema de identidade. Razões para isso, quais são? Inúmeras. Dentre elas, má gestão, que gera a falta de grana, que gera baixa qualidade do elenco, que gera receio no técnico de optar pelo jogo criativo e propositivo etc. E o que sobra é a camisa. Mas por quanto tempo? Tem já muito time pequeno que tá nem aí para o peso da camisa de time grande. E bom deixar claro: se já não respeitam é porque este sentimento brotou e se disseminou no próprio time grande da massa. E toda essa conversa é para quê? Para dizer, meus amigos, que o Flamengo já passou dessa fase. Tem boa gestão, recursos e pode e deve pretender coisas grandes. E para que serve a conclusão? Para pensarmos qual seria o perfil de volante ideal para o Rubro-Negro. Contudo, antes disso, pensemos um pouco mais no que espécie de jogador é o tal do volante.
Primeiro volante
Camisa 5 é aquele que marca, que rouba a bola e que cobre não só laterais mas um ou outro maluco da defesa que se lança ao ataque. No futebol brasileiro, cada vez mais ele funciona como um terceiro zagueiro, pois muitas vezes não só recua para formar uma linha de três, quando os laterais avançam, mas também se mantém recuado quando estes guardam posição, praticamente formando uma primeira linha de 5.
Já tivemos alguns muito bons até mesmo na Gávea. Porém, o apequenamento do futebol brasileiro fortaleceu a ideia de que ele tem de ser brucutu. Craque nesta função é o Ralf, pois executa bem seu papel, mas sem levar muitos cartões. E jogadores como o Ralf são disputados a tapa, pois são os preferidos da maioria dos nossos treinadores. No Flamengo, este jogador é o Piris da Motta. Mas se é verdade que no futebol atual uma equipe grande precisa buscar o controle do jogo ela precisa dispor de um volante de contenção que tenha a habilidade, controle da bola e que saiba ditar o ritmo. Afinal, o bom ritmo do futebol de uma equipe em geral ocorre quando ele começa no setor percorrido pelo camisa 5; se este jogador não tiver habilidade, vai delegar algumas ações para o segundo volante ou meias, sobrecarregando-os. Claro, tudo isto na perspectiva do jogo propositivo e baseado na posse da bola.
Então, o que foi a contratação do Piris da Motta? De Barbieri a Abel ninguém parece inclinado a escalar o Flamengo com um "doble 5" defensivo. O paraguaio é um reserva para Cuéllar, mas sem as mesmas características do colombiano. Por se assemelhar ao Ralf, e não ao Cuéllar, sua presença entre os titulares, em substituição ao colombiano, pode implicar numa mudança relevante no comportamento da equipe. Isto porque não se trata só de uma simples substituição. Estamos falando de um jogador-chave, provável que do verdadeiro ritmista da equipe. O ideal talvez fosse o de não ocupar uma vaga de estrangeiro com um reserva; este jogador poderia ser um garoto da base, que com perfil parecido ao do titular se educaria no banco de reservas ao ver o colombiano apresentar o melhor do seu futebol dentro das quatro linhas.
Deixando claro: nada contra o Piris, que é bom jogador naquilo que se propõe. Mas se já ficou claro que ele é diferente do colombiano, atento a duas características vitais. Cuéllar é especialista em ler corretamente os acontecimentos de uma jogada para se adiantar e fortalecer a pressão ou recuar no momento certo e se posicionar no local correto para intimidar a pressão da equipe rival. O outro traço em que se diferencia do Piris é na dosagem da força, algo que por certo, sejamos justo, poderia ser menos problemático à medida que o reserva jogasse mais, se entrosasse e melhorasse seu nível de confiança.
Segundo volante
E o chamado camisa 8 seria o quê? Suas funções consistem em auxiliar os meias na organização da equipe e criação de jogadas. Em tese, é quem recebe a bola de um defensor ou o primeiro volante, e a solta para o meia ou atacantes. Também pode se infiltrar pelo centro como elemento-surpresa e aparecer no entorno ou dentro da área para arrematar. Contudo, a tarefa do segundo volante precisa ser também a de marcar. E quando isto não acontece, ele sobrecarrega quem, em tese, já é o grande sobrecarregado da equipe, o camisa 5. E é isto o que a presença de Arão faz com o Cuéllar.
Para começo de conversa, a posição de segundo volante exige muita inteligência do jogador pois o seu posicionamento é bem dinâmico e ditado pelos acontecimentos de um jogo. Se não se cuidar, é bem possível que ele passe boa parte dos 90 minutos sem entender o que está acontecendo. E fica lá, sem serventia. A depender de certo jogador, nessas horas, ele se entrega ao nada; a depender de um outro, ele se infiltra em setores já ocupados por outros colegas de time e gera aquele famoso bate-cabeça. Para um segundo volante saber cavar seu espaço entre o 5 e o 10 não é ou não deveria ser um exercício para qualquer um. Sendo claro, Arão não deve ser o camisa 8 do Fla porque quando ele recua à faixa central do campo parece se hospedar em território desconhecido. Além disso, quando circula após a faixa central não parece entender a fluidez do jogo pelo setor, o que dificulta sua leitura dos acontecimentos e o impede de combater o contragolpe de modo satisfatório. O Jean Lucas talvez seja este jogador, mas o Flamengo tem recursos para contratar um ótimo reforço até para que seu garoto da base se espelhe nele e desenvolva ou sofistique o seu talento.
Volante misto
De uns tempos para cá, a denominação de volante misto se faz obrigatória para caracterizar o futebol de alguns jogadores. Trata-se do atleta que executa tão bem a função de 5 quanto a de 8. Cuéllar é um primeiro volante que em muitos momentos se comporta como um volante misto, mas é sobretudo um excelente camisa 5. Por seu apetite ofensivo Arão seria um volante misto, desde que soubesse executar as ações de um Piris da Motta, algo que, sabemos, ele não consegue fazer. A existência do chamado volante misto admite a presença de um camisa cinco de qualidade, e até mesmo de um 5 que só saiba marcar. Contudo, desautoriza a presença de um segundo volante. O ideal para uma equipe de ponta é que ela seja comandada por um "doble 5" de qualidade (um Cuéllar e mais um) ou por um bom camisa 5 e um misto. Dito isso, quais seriam os perfis indicados para o Flamengo?
Os melhores volantes para o Flamengo
Jormam Campuzano (22) é volante do Atlético Nacional. Este jogador atuava na segunda divisão da Colômbia e por aqui já havia quem o conhecesse antes mesmo do Atlético Nacional, por um acaso, chegar até ele e o contratar por uma mixaria. Hoje, já faz parte da seleção cafetera, embora ainda seja bem desconhecido. Trata-se de um veterano de 22 anos, que é um típico camisa 5 de excelente nível técnico. Com o técnico Almirón, aprendeu a se infiltrar na defesa para fazer a saída de bola com a qualidade de poucos. Seu passe é preciso e consciente. Para facilitar as transições, utiliza o passe médio aéreo, que faz a redonda chegar exatamente nos pés de seus colegas mais à frente.
Campuzano dar o bote com precisão cirúrgica. Seu jogo é um alívio para laterais que se lançam ao ataque. Por ser muito forte e conduzir bem a redonda tem o perfil de volante de infiltração; quando isto acontece, seu arremate da entrada da área é uma arma interessante para ser utilizada em situações de jogo nas quais nada parece dar certo. Na pressão sobre o rival ele tende a se posicionar um pouco mais à frente. Mas sua leitura impecável das jogadas, nas transições para o campo de defesa, é garantia de que o contragolpe pode dar errado. Isto ocorre porque nessas horas entender se a bola será conduzida pelo portador ou se será passada para outro jogador é o que via de regra determina a quebra do contragolpe. Campuzano é perito na arte de entender o que vai acontecer e para quem a redonda será passada em velocidade. Raramente ele erra. Então, dificilmente o "touro indomável" do Atlético Nacional não a intercepta quando ela vai de encontro de algum atacante na trama rival.
Por vezes, somos tomados pela impressão de que o colombiano se imagina como o único jogador em campo que deve conter o ataque rival. Desta forma, a inteligência em saber se posicionar ganha relevo em relação aos esforços de se transformar em três ou quatro ao mesmo tempo. Para resumir: chega a ser chato de ver como Campuzano parece ser seguro. Com Cuéllar, faria um "doble 5" defensivo moderno; ou seja, nada passaria.
Leonardo Gil (27), volante misto do Rosário Central, é opção interessante. Além de ser ótimo recuperador de bola também assiste muito bem, pois tem bom passe médio e longo. Aos poucos tem aprendido a se infiltrar como elemento-surpresa, o que é muito bom, pois sua condição física privilegiada permite tanto que apoie o ataque quanto que retorne a tempo para trancar a casa, no meio-campo. Seu futebol lembra o de Charles Aránguiz, de quem é um admirador confesso.
Apesar da qualidade de seu futebol, a imaturidade na leitura das jogadas o impediu de se destacar, após deixar a base e ingressar na equipe profissional do CAI, de Comodoro Rivadávia, clube do acenso argentino. Mas este problema não existe mais. Leonardo Gil é volante de categoria e já parece dispor da maturidade suficiente para não sentir a camisa de um clube como o Flamengo. Outra vantagem é a polivalência. Ele pode atuar como volante interior ou como lateral-esquerdo. E com detalhe: sem perder a qualidade de seu futebol.
Marcelo Díaz (32), volante chileno do Racing, é alguém que parece estar no auge de sua condição técnica, além da excelente forma física. Isto importa bem, pois problemas físicos não raro atrapalharam um dos melhores volantes que a América do Sul produziu neste século. Díaz não seria jogador para o Flamengo obter lucro financeiro mais à frente; é jogador para conquistar títulos.
Na cartilha de Marcelo Díaz tudo o que se espera de um bom volante é oferecido com generosidade. Combate ao portador da bola, saída de jogo, passe curto, médio e longo: tudo ele parece fazer bem. Tipo de jogador que faz o futebol parecer ser mera brincadeira de fim de semana; algo fácil e ao alcance de todos. Faria um "doble 5" defensivo com Cuéllar de arrepiar para qualquer atacante rival. Sua entrega à camisa e ao jogo é tão intensa que o leva, muitas vezes, a reclamar excessivamente do árbitro ou de quem ao seu lado parece desinteressado com o jogo. Isto é um efeito colateral da garra e respeito de Marcelo Díaz pela camisa que veste. Não seria caro, não seria para investimento financeiro, mas seria para encorpar de vez o que seria, com sua presença, um grande Flamengo em 2019.
Edson Álvarez (21), jogador do América, é um dos maiores talentos que surgiu no México nas duas últimas décadas. Pensemos juntos em um jogador que consegue ser volante, lateral ou zagueiro e sem perder nem um pouco o seu grande nível futebolístico; pois bem, este é Edson Álvarez, junto com Lainez, duas das sensações atuais do futebol mexicano. Porém, enquanto Lainez é muito caro por ser um atacante e chamar mais a atenção, Álvarez ainda é, para muitos, um mero desconhecido.
Mas por que o Flamengo contrataria um jovem de 21 anos, se tem inúmeros no elenco, inclusive na zaga? Deveria contratar porque independente dos grandes jogadores que já possui, "la Joya" mexicana seria um dos maiores destaques do elenco. Como já dito, ele poderia ser um zagueiro, porém não seria um zagueiro qualquer. Com La Volpe, Álvarez aprendeu a ser um clássico camisa 3 que sabe sair jogando, tem bom jogo aéreo e um belo passe desde o fundo. Como lateral, possui um fôlego de búfalo para fazer o corredor direito e com sobra. Como volante, seria outro caso de doble 5 defensivo do estilo "não passa nada". Mesmo ainda tendo poucas características de um volante misto, o mexicano costuma aparecer no ataque e fazer estragos. Passe deste jogador custaria uns US$ 5 milhões. Após uma temporada no futebol brasileiro, iria à Europa por no mínimo US$ 20.
Iván Marcone (28), camisa 5 argentino, é uma espécie de diretor de orquestra; definitivamente é quem dita o ritmo das equipes em que joga. Foi assim já no início de sua carreira no Arsenal de Sarandí; depois, foi peça-chave no Lanús vice-campeão da Libertadores e agora tem sido assim no Cruz Azul. Antes de sua chegada à América do Norte a tradicional "Máquina Celeste" parecia um um amontoado de jogadores. Marcone foi o responsável, dentro de campo, por transformá-la numa das equipes mais competitivas do futebol mexicano.
Seu jogo gera inúmeras possibilidades para a construção do ataque. E elas ocorrem prioritariamente de duas maneiras. Desde a primeira linha, para onde ele retorna para fazer a saída, e também a partir das roubadas de bola, o que ocorre em vários setores da cancha. Na construção desde o fundo Marcone utiliza seu passe precioso, que pode ser curto, médio ou longo a depender de como os jogadores de sua equipe estão posicionados. Se deseja atrair os atacantes ou toca de lado ou recua, em geral com passes curtos. O comando é todo dele, a bola sempre retorna aos seus pés, pois a garantia de se conseguir superioridade numérica não está relacionada simplesmente à atração dos rivais, mas à sabedoria de dar o passe decisivo para tal.
Fácil de vermos um volante que saiba roubar a bola; difícil é pensarmos em número relevante daqueles que sabem o que fazer com ela. Márcio Araujo, por exemplo, até roubava (embora bem menos do que algumas pessoas queriam acreditar), mas depois as entregava de volta e sem nenhum constrangimento. Todo mundo ria: alguns de raiva, ele de alegria, pois acreditava que fazia a coisa certa. Questão é que um "cabeça-de-bagre" coloca toda a sua energia na ação de roubar uma pelota; depois disso, feliz, se acomoda, descansa e recupera o fôlego. Felizmente para alguns, esta ação é só parte de seu trabalho como volante. Roubar bolas para Marcone é pouco; ele é especialista em fazê-lo de forma limpa, sem cometer faltas. E a prova de que seu passe é precioso está no fato de que foi o melhor passador do campeonato mexicano; quase não erra um. Com a redonda sob seu domínio, os jogadores de frente têm a liberdade de se deslocarem como bem quiserem, pois o bola do camisa 5 vai chegar com precisão para qualquer um deles.
Com Cuéllar, Marcone faria um "doble 5" defensivo do tipo que quase dispensa os armadores a partir da faixa central. Sua adaptação aos clubes aonde chega é rápida e ignora países, modelos de jogo ou qualidade do elenco. Um efeito colateral de sua contratação é que quando não está em campo parece faltar identidade para a equipe, assim como equilíbrio entre as linhas e mobilidade correta para a construção do jogo propositivo.
Na noite do dia 10 de janeiro, o Boca Juniors fez uma proposta para o Cruz Azul pelo jogador.
Mateus Uribe (27), colombiano do America/MX, é o típico jogador cujo futebol expressa o significado do volante misto. E neste quesito, é um dos melhores na América Latina. Sua vida discreta e reclusa fora de campo contrasta com o seu futebol vistoso e de jogadas que muitos torcedores só conseguem esquecer no jogo seguinte. Sua personalidade é atrativa, chama a bola, chama a responsabilidade pela construção do jogo e chama a atenção dos marcadores rivais como poucos outros conseguem fazer. Uribe é um resumo do que um volante moderno precisa ser.
O colombiano joga por terra aquela impressão de que um marcador implacável não pode ser habilidoso e vital para a construção do jogo. Vale destacar que sua capacidade de marcar está associada à antecipação e à ocupação dos espaços corretos. Porém, se é um marcador de relevo é da mesma forma um jogador muito difícil de ser marcado pelos rivais. Em parte, por causa de sua categoria em se deslocar por todos os setores do campo com grande mobilidade; em parte, porque no de ataque parece desfilar por espaços obscuros do campo. Do nada aparece como ponteiro que se infiltra em diagonal ou dar o passe certeiro; do nada chega na cara do gol. Sua participação no último terço é uma afronta para os zagueiros desatentos. Sua participação na campanha que levou "Las Águillas" ao título nacional oferece, ao menos à "zagueirada" uma noção do que estamos falando.
No América, tudo passa pelos pés do colombiano. A condução da bola é tão veloz quanto eficiente, mas Uribe é sobretudo um ritmista que sabe a hora de dar uma pausa, acelerar, recuar e dar o passe no momento certo. Também tem a habilidade de atrair a marcação e abrir espaço para seus companheiros.
Defensivamente também não deixa a desejar. Mas não é um senhor ladrão de bolas como outros volantes destacados aqui. Como já dissemos, sua marcação se faz eficiente na antecipação e menos no contato físico. Aliás, em termos físicos, Uribe ainda tem algo a evoluir. Por certo já teria conseguido se não se desgastasse tanto numa partida. Não é um jogador que se lesiona, longe disso, mas uma consulta a seus companheiros testemunharia o quanto o colombiano deve se jogar numa cama assim que chega aos vestiários. Sua entrega é contagiante e se não fosse tão inteligente por certo que alguém precisaria avisá-lo sobre o apito final do juiz, após os 90 minutos.
Victor Cantillo (25), do Junior Barranquilla, cai fácil naquela definição de "Monstro". Garoto aí é dos volantes que mais tem evoluído no futebol da América do Sul; do tipo que ri da forma como ele mesmo jogava há coisa de dois anos. E olha que dois anos atrás já era acima da média. Mas em que aspectos Canitllo tanto evoluiu e em tão pouco tempo? Nada de precipitações, antes disso, vamos traçar algumas de suas características primeiro.
Cantillo é um volante misto; camisa 8 que sabe ser 5 e 10, ao mesmo tempo. Nada o assusta; rival, camisa, estádio, torcida, nada. Em quaisquer circunstâncias ele pratica seu jogo vistoso e eficiente com a mesma desenvoltura. Perito no passe inicial que gera as transições, perito na bola longa que corta caminho e se depara com o atacante na cara do gol, perito em rodar a pelota de um lado a outro, esfriando a partida, acelerando-a, arbitrando-a à sua maneira como se jogar futebol fosse fácil. Magro e alto, mais parece um desengonçado perdido no campo e suplicando para o jogo acabar. Porém, um olhar atento vai se deparar com um exímio protetor da redonda que determina a priori quem manda no lance e contra quem a pressão da marcação alheia não interfere em nada quanto à sua decisão de soltar a pelota. Hora de passar é ele quem sabe e, com efeito, isto está diretamente vinculado ao ritmo que o volante pretende ditar à partida.
No Junior, era possível vê-lo trabalhando o passe para o setor esquerdo do campo e aglutinando um bom números de jogadores por ali. Então, quando os rivais caíam na armadilha de igualar o contingente no setor, Cantillo iniciava o deslocamento para o outro lado, o direito. Em geral, através de passes longos, que não permitiam aos defensores rivais a remontagem da linha. Desta forma, Cantillo praticamente decidia, muitas vezes, por qual lado a sua equipe deveria atacar.
Outro ponto interessante é o seguinte: na fase ofensiva de pressão, Cantillo se posiciona bem próximo aos acontecimentos dentro ou no entorno da área. Se a infiltração se faz complicada, a bola em geral volta para seus pés, que ora reinicia o processo, suavizando a pressão com toques curtos, ora encurta os acontecimentos com uma assistência matreira entre linhas. Ao mesmo tempo, quando a pelota é recuperada pela zaga, ele no mínimo fecha a saída pelo setor esquerdo e, na média, pressiona o portador para recuperar a bola. E nisto é que está o ponto abordado anteriormente, sobre o fato de ser Victor Cantillo um dos volantes que mais evolui na América do Sul.
Se olharmos os números de quem mais roubou bolas na Libertadores/2018, vamos encontrar Pablo Pérez em primeiro lugar, com 110 bolas roubadas, o que dá uma média de mais de 7,5 por jogo; em seguida vem Wilmar Barrios, com 106, e média de 7 por partida. Cantillo roubou 82 bolas, mas como jogou bem menos que os dois finalistas da competição, tem média de 10,5 bolas roubadas por partida. Este número é tão absurdo que ele supera as ações de Leonardo Pico, seu companheiro de equipe e jogador que está em campo para este tipo de ação. Enfim, um monstro dentro de campo, mas com um detalhe: sem sujar o calção.
Bem, falamos no início que Abelão provavelmente não jogará com um doble 5 defensivo. O fato é que até para técnicos mais tradicionais fica claro que dois camisas 5 que participam da criação dispensam o segundo volante. Contudo, se a ideia é mesmo a de ter o "segundo volante" a lista contemplou esta necessidade. Para finalizar, apontaremos algumas promessas que se destacarão na America do Sul brevemente. Poucos chegariam para a titularidade no Fla, atualmente. Mas fica a dica para os nomes dos meninos abaixo.
Pedro Ojeda (21) Rosário Central. Atua como primeiro volante ou como segundo volante. Tem excelente primeiro passe e senso de colocação. Outro que torna fácil a vida de qualquer lateral. Drible e passe tem de sobra. Porém, costuma ser econômico nos gestos. Ideia é sempre a de utilizar sua categoria para tranquilizar antes da faixa central e para fazer o simples, porpém eficiente, quando se aproxima da grande área rival. Ainda um pouco verde. Mas promete.
Gianluca Mancuso (20) é um camisa 5 do Vélez Sarsfield. Filho dele? Isso mesmo, do "Mancusão", que atuou pelo Flamengo e também pelo Palmeiras. O filho é melhor que o pai; ao menos tecnicamente. Se vai conseguir desenvolver todo o seu potencial, outra história. Porém, já se projeta como um dos melhores volantes jovens das "canteras" argentinas. Tem bom passe, muita força física, forte proteção à zaga e a garra que todos conheceram no futebol do seu pai. Joga fácil.
Ariel Uribe (19) é segundo volante chileno do Monarcas Morélia. Também pode atuar como camisa 5, sua posição de origem. Mas o que ninguém entende é por que o tal técnico da equipe mexicana colocou o garoto para jogar como extremo pela esquerda. Tudo bem que não falta velocidade para Uribe, mas é um enorme desperdício. A grata revelação chilena acerta quase 100% dos passes, costuma recuperar a pelota já bem antes de saber o que fará com ela. Habilidoso e inteligente Uribe demonstra que sua evolução está só no começo. Tem potencial para se destacar no futebol europeu em pouco tempo e é bem possível que isto realmente aconteça.
Tomás Belmonte (20) é mais uma revelação da "cantera" do Lanús. Se você começou a leitura deste texto pelo fim, a recomendação é a seguinte: pare, pegue um telofone ou entre nas redes sociais. Em seguida, perturbe o dirigente do seu clube até ele se convencer a buscar o Belmonte. Brincadeira o que joga esse garoto. Primeiro ou segundo volante? Tanto faz! Tanto a camisa 5 quanto a 8 vestem bem nele. Aos poucos tem se convertido num volante misto e com perfil de quem sabe fazer gols. Se precisar, o garoto busca a redonda na primeira linha e solta para os jogadores de frente; se precisar, se apresenta no entorno ou dentro da área para guardar. Do tipo que vale a pena contratar nem que seja para emprestá-lo a uma equipe menor.
Raúl Loaiza (24) é volante colombiano do San Lorenzo. Jogador de muita vitalidade e com excelente marcação na faixa central. Daquela estirpe de jogador que não se assusta com a pressão dos atacantes rivais. Sempre colocou sua velocidade a serviço da equpe, mas bastou ser treinado por Almirón para priorizar o manejo da bola com calma. Seus passes curtos e médios são precisos e seus passes longos vem ganhando relevo à medida que seu estilo de jogo se sofistica. Também nele vale a pena ficar de olho.
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sexta-feira, 11 de janeiro de 2019
sexta-feira, 25 de maio de 2018
Joza Novalis: "Flamengo precisa de um técnico"
Após a saída do Rueda, o Flamengo improvisou Carpegiani, que seria o coordenador. Não durou muito tempo. Três meses depois, efetivarem o auxiliar, Maurício Barbieri.
Na prática é isso: o Rubro Negro está chegando no sexto mês sem treinador.
quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018
Libertadores 2018: Dossiê River Plate, por Joza Novalis
Confira a análise completa sobre o rival do Flamengo, na estreia da Libertadores dessa quarta-feira, por Joza Novalis.
River Plate rival do Flamengo na data de hoje, como está? Um lixo: bom deixar claro. E o que isto significa? Depende. Muita coisa, Ou nada. Mas por quê? Ora, pois! Basta olharmos para o elenco do River para pensarmos...que luxo! O fato é que um time de futebol sairá desta dualidade, hoje à noite. E o que ele levará para campo é tão imprevisível quanto ao gigantismo que porta. E se isto parece assustador, joguemos lenha na fogueira do assombro: o inimigo da esquadra argentina não é o Flamengo; o inimigo é invisível, o Rubro-Negro, só uma parte dele.
Luz sobre o momento do River
A equipe dirigida por Marcelo Gallardo ocupa a 20ª posição da tabela da Superliga, que é composta por 28 equipes. Das 17 partidas que disputou, venceu cinco, empatou quatro e sofreu oito derrotas. Seu ataque marcou 20 gols e sofreu 23; sua defesa levou gols praticamente todos os jogos, exceto nas vitórias por 2x0 contra o Unión, pela 12ª rodada, e contra o Olimpo, pela 14ª, e por 1x0 contra o Temperley na rodada inicial da Superliga, ainda em 2017. No momento, o Millo está a 24 pontos do líder e grande rival, Boca Juniores, e a preocupação já não é com o título. Preocupação suprema é a de chegar entre os seis primeiros de modo a conseguir uma vaga na próxima libertadores. Fácil? Bem, por enquanto parece que não, pois são nove pontos de distância do sexto colocado, o Huracán. Além disso, para piorar, a equipe dirigida por Gallardo está a oito pontos do Colón, o 11º colocado e última equipe da tabela na zona de classificação para a Copa Sul-Americana.
Pouco? Bem, fora de casa já são seis derrotas consecutivas. Para se ter uma ideia do feito, isto não ocorria no campeonato argentino há 78 anos. Como visitante, a última vitória foi em setembro, quando superou o San Martín, em San Juan, por 3x1. Na ocasião, Gallardo colocara em campo uma equipe praticamente reserva, pois poupava jogadores para o confronto de volta contra o Wilstermann e que levaria sua equipe às semifinais da última edição da Libertadores de América.
Quando o River joga alguma coisa, como joga? Quem sabe?
Ao menos em termos de esquema, nem Gallardo consegue responder. O técnico já usou desde o 3-2-2- 3, praticamente excluindo laterais, na partida contra o Wilstermann, a inúmeros outros, como 4-3-2-1, 4-4-2, 4-3-1-2, 4-2-2-2 entre outros. Mas se tudo depende do momento, nem tudo depende do rival. Explicando: Diante de dificuldades, o River tende a pensar o rival não por se preocupar com os perigos que ele possa lhe causar, mas por descobrir formas de como vencê-lo melhor. Arrogância pura de um clube gigante que acredita haver somente um rival com sua estatura na América do Sul: o Boca Juniors. Duas notas sobre o caso. Primeira é que o Boca pensa a mesma coisa. Segunda, é que a mesma postura nosso clubes costumam, em regra, praticar. E em parte o futebol não evolui por aqui porque os pequenos, médios e grandes (exceto Boca e River) da América do Sul espanhola seguem nos olhando de forma atenta enquanto nós só construímos uma dimensão mínima sobre eles quando os encontramos dentro de campo.
Mas vejamos pelo lado positivo. Se para o River o Mengão é mais um empecilho a ser superada rumo ao caneco da competição, cabe saber tirar vantagens disto, se enquadrar na perspectiva do Millo, mas, sobretudo, não gerar enquadramento para o foco dos argentinos. Ser visto como uma mera pedra no caminho de alguém tem lá suas vantagens. No momento, ainda mais, pois mesmo agora a equipe argentina não está muito atenta à esquadra carioca: foco é todo em si mesmo e na tentativa de matar o que possa ser o seu inimigo invisível.
O esquema no Rio será um 4-3-1-2, com os seguintes intérpretes: Armani; Montiel (Mayada), Martínez Quarta, Maidana, Saracchi (Casco); Enzo Pérez, Leonardo Ponzio, Bruno Zuculini; Juna Fernando Quintero; Nacho Scocco e Lucas Pratto.
Dúvida somente acerca de quem vai ser o enganche, já que Pity Martínez, lesionado, não atuará. Juan Fernando Quintero ou De La Cruz pode ocupar a vaga do pequeno “menino mágico” de Bajo Belgrano. Quintero é um monstro de jogador, mas ainda se adapta ao novo país, clube e comissão técnica. Enquanto isso, seu futebol vive de “brilharecos”. Sim, alguns deles tão decisivos que chegam a assustar. Mas embora não cave buracos em campo para se esconder, o meia passa muito tempo desaparecido na superfície do campo. De La Cruz não porta a mesma magia do colombiano, mas se notabiliza por unir força, condução e bom passe em velocidade. Mas ao contrário de Quintero tende, por vezes, a considerar excessiva a responsabilidade jogada às suas costas. Além disso, é mais fácil de ser anulado do que Juan Fernando.
Atuar com um enganche é traço decisivo da personalidade do River. Porém, Gallardo tem se notabilizado por reduzir a responsabilidade da criação que tradicionalmente fica muito a cargo deste jogador. Sendo assim, os laterais atuam praticamente como alas. Tecnicamente eles são tão habilidosos quanto quaisquer daqueles que atuam do meio-campo para frente. Portanto, a pressão tende a ser alta e de face dupla: tem quantidade e qualidade. Pensando exclusivamente no 4-3-1-2, diríamos que enquanto persiste um equilíbrio possível ele se transforma no 2-3-1-4. No desespero, numa espécie de 2-2-1-5 ou coisa parecida. Mas isto quando a equipe atua diante de seus torcedores. Na partida de hoje, nem tanto. Ponzio e Zuculini atuarão como um dobre 5 defensivo, enquanto Pérez, o camisa 8 do trio, se permitirá avançar um pouco, embora somente na boa.
Montiel ou Mayada, na lateral direita e Saracchi ou Casco na esquerda, o que podem representar? Um erro. Todos são laterais com características ofensivas. Ou seja, se Gallardo deseja segurá-los no setor defensivo não terá facilidades para tal, pois não sabem marcar. Jeito é o Flamengo abusar de jogar pelos lados do campo. Mas se tiver de fazê-lo que o faça com prudência e sabedoria, pois Zuculini ficará atento a bolas perdidas pelo ataque rubro-negro e se elas chegarem aos seus pés, o passe preciso vai ser não apenas o desafogo da equipe de Gallardo, mas também a construção do jogo ainda antes da faixa central.
Nacho Scocco é dos jogadores mais sóbrios na equipe argentina. Pratto ainda caça borboletas, ou, dito de outra maneira, ainda procura pelo espaço correto do campo por onde possa atuar. Para um defensor atento vale sempre a dica: se um jogador está perdido, não o perca de vista, por certo. Mas convém tomar cuidado para não se perder na partida juntamente com ele. Ou seja, o olhar sobre Luccas Pratto pode ser de longe, de média distância ou de perto; sobre el Nacho é olhos nos olhos.
Tudo resulta em pressão e leva à intensidade. Mas qual? Ou, “a força da camisa entra em campo?”
Ninguém entende o que se passa com o Millo. Contudo, a gota que entona o copo não parece ser gerada na competição local. Ela estaria na Libertadores e pode não ser transparente, mas rubro-negra. Possível problema para o Fla está no fato de que tanto jogadores quanto comissão técnica parecem entender este fato. Afinal, para Gallardo: “O vento que sopra contra nossa equipe é preciso ser afrontado de frente. E a partida contra o Flamengo, na quarta, será o momento decisivo para tal”, Muñeco Gallardo, momento depois da última derrota para o Velez Sarsfield por 1x0.
Falta de grana? Longe disso. Foram 43 milhões de dólares em reforços nas duas últimas janelas e a chegada de 11 reforços. Uma grana alta gasta apenas em dois goleiros, dois defensores, quatro meias e três atacantes. De todos eles, somente Armani se converte no maior acerto: é o único que convence, por hora. Pinola, Pratto e Pérez estão mal, não convencem e não justificam suas contratações. Do que funcionava antes, tínhamos um meio-campo com Nacho Fernandez, Ponzio, Rojas e Pity. Nacho e Martínez perderam sintonia e parecem desconhecer os espaços que cada um percorre na cancha. Em tais momentos, Fernandez compensa um pouco ao virar um bom marcado. Problema é que melhores que ele sentam no banco de reservas. Pior ainda no caso de “el” Pity, que some da partida. Pelo caráter de sua personalidade, quando isto acontece ele tende a se intimidar, o que o leva a falhar nas escolhas mesmo nos poucos momentos em que a pelota chega aos seus pés. Rojas ocupa o setor esquerdo e, no momento, bate cabeça sobretudo com o ala.
Mas o problema maior foi de planejamento. Alário era um nove que resolvia. Pratto não é este jogador, é diferente, embora útil e muito acima da média. Scocco ocupa seu lugar, e escancara dois problemas. Também ele não se parece com Alário, mas com Pratto. Além disso, o ex-jogador são-paulino é o quê? Um extremo pela esquerda do campo? Ora, neste caso ele tampouco possui as características de Driussi. Jeito qual é? Quem sabe? Mas talvez fosse o caso de mandar um deles para o banco de reservas. Problema é que Gallardo não entende que certos testes precisam ter hora marcada para acabar. Mas o Muñeco tem culpa? Sim, pois no River, ao contrário do que acontece por aqui, quem define a contratação de um jogador, não é o departamento de futebol, mas o técnico. Foi o treinador do River quem levou o nome de Lucas Pratto para os dirigentes. Erro grave? Da missa, contudo, só a metade. Foi o mesmo Gallardo quem levou, depois, o nome de Silvio Romero para o departamento de futebol. Romero pode ser um 8, um segundo atacante ou um falso nove, mas também não é um jogador com as características de Alário e tampouco com as de Sebastián Driussi. Se a mudança de esquema era o que estava na órbita, ela deveria ser processada, em treinos, bem antes dos reforços chegarem, mesmo antes do fim do ano; o que não aconteceu. Ou seja, uma fortuna foi gasta de maneira pouco pensada, o que contrasta com a eficiência na gestão anterior de recursos que redundou numa liquidez ímpar na história do clube argentino.
Dentro de campo a criatividade sumiu. A equipe tem sérias dificuldades na distribuição da bola, com poucas opções claras de passes, pois as linhas não são claras para o portador da bola. Disto resulta decisões erradas ou insuficientes. A falta de ideias para romper linhas inimigas gera o toque de bola esvaziados de expetativas. A previsibilidade salta aos olhos dos marcadores, que bloqueiam facilmente as tentativas de construção de jogo ou os poucos ataques que delas resultam. Se há um grave perigo para a essência do jogo propositivo é a presença nele da desordem. Ela desorienta as ações nos momentos da necessária recomposição. Isto é precisamente o que acontece atualmente com o rival do Flamengo. Dentro disso, posse de bola quer dizer muito pouco, pois basta apenas uma delas perdida na fase ofensiva para que seus rivais o consigam golpear com um contragolpe fatal.
Se tais problemas parecem impossíveis de serem solucionados, ao menos a estreia do River ocorre fora de casa, onde o jogo especulativo tende a ser mais eficiente do que o seu contrário. Claro que neste contexto o Flamengo pode tirar vantagens, pois encaixará com mais facilidade uma pressão sobre os argentinos. Porém, uma coisa é pressionar um Boavista, a outra fazê-lo contra um rival do quilate de um River Plate. Ocorre que se há um traço positivo na adoção do jogo especulativo ele está precisamente na observação, da equipe que o adota, sobre quem o pressiona em seu campo de defesa. E o caráter do olhar de jogadores de um time pequeno sempre é menos apurado do que aquele que portam os atletas de uma esquadra de porte.
Intensidade não falta ao River. Problema é o seu caráter. Sobra sangue nos olhos, mas ninguém sabe como canalizá-lo para o futebol propositivo que está no DNA da equipe. O esquema não ajuda, o desentrosamento tampouco. Algo precisa dispará-lo e isto pode contudo aparecer na estreia contra o Flamengo. Trata-se do tal “inimigo invisível”. Na falta de uma configuração sobre o que ele possa ser ao menos vale uma caracterização qualquer.
No momento, de duas semanas para cá, ela tem se construído no discurso de que o mundo está contra o River, que perseguido caminha só, amparado apenas na sua tradição. Conversa? Vão nessa! Grandes ídolos do passado, que sempre palpitam demais canalizam suas observações à necessidade da equipe se reconectar com sua história e levar esta alma de gigante para o jogo. Uma alma gigantesca que não merecia, por exemplo, os prejuízos que a arbitragem tem praticado contra ela. E para tal nada como a péssima arbitragem Jorge Baliño, que fez algo raro: errou e prejudicou a equipe de Gallardo.
Era tudo o que o elenco millonario precisava para atribuir um sentido à intensidade que praticam em campo. O inimigo que era invisível ganha corpo agora no vento que sopra contra e que atenta gravemente à estatura e “dignidade” do clube. E “O vento que sopra contra nossa equipe é preciso ser afrontado de frente. E a partida contra o Flamengo, na quarta, será o momento decisivo para tal”. Este é o cambaleante e perigoso rival que o Rubro-Negro vai recepcionar e tentar superar na noite de hoje? Possível? Quem sabe?
River Plate rival do Flamengo na data de hoje, como está? Um lixo: bom deixar claro. E o que isto significa? Depende. Muita coisa, Ou nada. Mas por quê? Ora, pois! Basta olharmos para o elenco do River para pensarmos...que luxo! O fato é que um time de futebol sairá desta dualidade, hoje à noite. E o que ele levará para campo é tão imprevisível quanto ao gigantismo que porta. E se isto parece assustador, joguemos lenha na fogueira do assombro: o inimigo da esquadra argentina não é o Flamengo; o inimigo é invisível, o Rubro-Negro, só uma parte dele.
Luz sobre o momento do River
A equipe dirigida por Marcelo Gallardo ocupa a 20ª posição da tabela da Superliga, que é composta por 28 equipes. Das 17 partidas que disputou, venceu cinco, empatou quatro e sofreu oito derrotas. Seu ataque marcou 20 gols e sofreu 23; sua defesa levou gols praticamente todos os jogos, exceto nas vitórias por 2x0 contra o Unión, pela 12ª rodada, e contra o Olimpo, pela 14ª, e por 1x0 contra o Temperley na rodada inicial da Superliga, ainda em 2017. No momento, o Millo está a 24 pontos do líder e grande rival, Boca Juniores, e a preocupação já não é com o título. Preocupação suprema é a de chegar entre os seis primeiros de modo a conseguir uma vaga na próxima libertadores. Fácil? Bem, por enquanto parece que não, pois são nove pontos de distância do sexto colocado, o Huracán. Além disso, para piorar, a equipe dirigida por Gallardo está a oito pontos do Colón, o 11º colocado e última equipe da tabela na zona de classificação para a Copa Sul-Americana.
Pouco? Bem, fora de casa já são seis derrotas consecutivas. Para se ter uma ideia do feito, isto não ocorria no campeonato argentino há 78 anos. Como visitante, a última vitória foi em setembro, quando superou o San Martín, em San Juan, por 3x1. Na ocasião, Gallardo colocara em campo uma equipe praticamente reserva, pois poupava jogadores para o confronto de volta contra o Wilstermann e que levaria sua equipe às semifinais da última edição da Libertadores de América.
Quando o River joga alguma coisa, como joga? Quem sabe?
Ao menos em termos de esquema, nem Gallardo consegue responder. O técnico já usou desde o 3-2-2- 3, praticamente excluindo laterais, na partida contra o Wilstermann, a inúmeros outros, como 4-3-2-1, 4-4-2, 4-3-1-2, 4-2-2-2 entre outros. Mas se tudo depende do momento, nem tudo depende do rival. Explicando: Diante de dificuldades, o River tende a pensar o rival não por se preocupar com os perigos que ele possa lhe causar, mas por descobrir formas de como vencê-lo melhor. Arrogância pura de um clube gigante que acredita haver somente um rival com sua estatura na América do Sul: o Boca Juniors. Duas notas sobre o caso. Primeira é que o Boca pensa a mesma coisa. Segunda, é que a mesma postura nosso clubes costumam, em regra, praticar. E em parte o futebol não evolui por aqui porque os pequenos, médios e grandes (exceto Boca e River) da América do Sul espanhola seguem nos olhando de forma atenta enquanto nós só construímos uma dimensão mínima sobre eles quando os encontramos dentro de campo.
Mas vejamos pelo lado positivo. Se para o River o Mengão é mais um empecilho a ser superada rumo ao caneco da competição, cabe saber tirar vantagens disto, se enquadrar na perspectiva do Millo, mas, sobretudo, não gerar enquadramento para o foco dos argentinos. Ser visto como uma mera pedra no caminho de alguém tem lá suas vantagens. No momento, ainda mais, pois mesmo agora a equipe argentina não está muito atenta à esquadra carioca: foco é todo em si mesmo e na tentativa de matar o que possa ser o seu inimigo invisível.
O esquema no Rio será um 4-3-1-2, com os seguintes intérpretes: Armani; Montiel (Mayada), Martínez Quarta, Maidana, Saracchi (Casco); Enzo Pérez, Leonardo Ponzio, Bruno Zuculini; Juna Fernando Quintero; Nacho Scocco e Lucas Pratto.
Dúvida somente acerca de quem vai ser o enganche, já que Pity Martínez, lesionado, não atuará. Juan Fernando Quintero ou De La Cruz pode ocupar a vaga do pequeno “menino mágico” de Bajo Belgrano. Quintero é um monstro de jogador, mas ainda se adapta ao novo país, clube e comissão técnica. Enquanto isso, seu futebol vive de “brilharecos”. Sim, alguns deles tão decisivos que chegam a assustar. Mas embora não cave buracos em campo para se esconder, o meia passa muito tempo desaparecido na superfície do campo. De La Cruz não porta a mesma magia do colombiano, mas se notabiliza por unir força, condução e bom passe em velocidade. Mas ao contrário de Quintero tende, por vezes, a considerar excessiva a responsabilidade jogada às suas costas. Além disso, é mais fácil de ser anulado do que Juan Fernando.
Atuar com um enganche é traço decisivo da personalidade do River. Porém, Gallardo tem se notabilizado por reduzir a responsabilidade da criação que tradicionalmente fica muito a cargo deste jogador. Sendo assim, os laterais atuam praticamente como alas. Tecnicamente eles são tão habilidosos quanto quaisquer daqueles que atuam do meio-campo para frente. Portanto, a pressão tende a ser alta e de face dupla: tem quantidade e qualidade. Pensando exclusivamente no 4-3-1-2, diríamos que enquanto persiste um equilíbrio possível ele se transforma no 2-3-1-4. No desespero, numa espécie de 2-2-1-5 ou coisa parecida. Mas isto quando a equipe atua diante de seus torcedores. Na partida de hoje, nem tanto. Ponzio e Zuculini atuarão como um dobre 5 defensivo, enquanto Pérez, o camisa 8 do trio, se permitirá avançar um pouco, embora somente na boa.
Montiel ou Mayada, na lateral direita e Saracchi ou Casco na esquerda, o que podem representar? Um erro. Todos são laterais com características ofensivas. Ou seja, se Gallardo deseja segurá-los no setor defensivo não terá facilidades para tal, pois não sabem marcar. Jeito é o Flamengo abusar de jogar pelos lados do campo. Mas se tiver de fazê-lo que o faça com prudência e sabedoria, pois Zuculini ficará atento a bolas perdidas pelo ataque rubro-negro e se elas chegarem aos seus pés, o passe preciso vai ser não apenas o desafogo da equipe de Gallardo, mas também a construção do jogo ainda antes da faixa central.
Nacho Scocco é dos jogadores mais sóbrios na equipe argentina. Pratto ainda caça borboletas, ou, dito de outra maneira, ainda procura pelo espaço correto do campo por onde possa atuar. Para um defensor atento vale sempre a dica: se um jogador está perdido, não o perca de vista, por certo. Mas convém tomar cuidado para não se perder na partida juntamente com ele. Ou seja, o olhar sobre Luccas Pratto pode ser de longe, de média distância ou de perto; sobre el Nacho é olhos nos olhos.
Tudo resulta em pressão e leva à intensidade. Mas qual? Ou, “a força da camisa entra em campo?”
Ninguém entende o que se passa com o Millo. Contudo, a gota que entona o copo não parece ser gerada na competição local. Ela estaria na Libertadores e pode não ser transparente, mas rubro-negra. Possível problema para o Fla está no fato de que tanto jogadores quanto comissão técnica parecem entender este fato. Afinal, para Gallardo: “O vento que sopra contra nossa equipe é preciso ser afrontado de frente. E a partida contra o Flamengo, na quarta, será o momento decisivo para tal”, Muñeco Gallardo, momento depois da última derrota para o Velez Sarsfield por 1x0.
Falta de grana? Longe disso. Foram 43 milhões de dólares em reforços nas duas últimas janelas e a chegada de 11 reforços. Uma grana alta gasta apenas em dois goleiros, dois defensores, quatro meias e três atacantes. De todos eles, somente Armani se converte no maior acerto: é o único que convence, por hora. Pinola, Pratto e Pérez estão mal, não convencem e não justificam suas contratações. Do que funcionava antes, tínhamos um meio-campo com Nacho Fernandez, Ponzio, Rojas e Pity. Nacho e Martínez perderam sintonia e parecem desconhecer os espaços que cada um percorre na cancha. Em tais momentos, Fernandez compensa um pouco ao virar um bom marcado. Problema é que melhores que ele sentam no banco de reservas. Pior ainda no caso de “el” Pity, que some da partida. Pelo caráter de sua personalidade, quando isto acontece ele tende a se intimidar, o que o leva a falhar nas escolhas mesmo nos poucos momentos em que a pelota chega aos seus pés. Rojas ocupa o setor esquerdo e, no momento, bate cabeça sobretudo com o ala.
Mas o problema maior foi de planejamento. Alário era um nove que resolvia. Pratto não é este jogador, é diferente, embora útil e muito acima da média. Scocco ocupa seu lugar, e escancara dois problemas. Também ele não se parece com Alário, mas com Pratto. Além disso, o ex-jogador são-paulino é o quê? Um extremo pela esquerda do campo? Ora, neste caso ele tampouco possui as características de Driussi. Jeito qual é? Quem sabe? Mas talvez fosse o caso de mandar um deles para o banco de reservas. Problema é que Gallardo não entende que certos testes precisam ter hora marcada para acabar. Mas o Muñeco tem culpa? Sim, pois no River, ao contrário do que acontece por aqui, quem define a contratação de um jogador, não é o departamento de futebol, mas o técnico. Foi o treinador do River quem levou o nome de Lucas Pratto para os dirigentes. Erro grave? Da missa, contudo, só a metade. Foi o mesmo Gallardo quem levou, depois, o nome de Silvio Romero para o departamento de futebol. Romero pode ser um 8, um segundo atacante ou um falso nove, mas também não é um jogador com as características de Alário e tampouco com as de Sebastián Driussi. Se a mudança de esquema era o que estava na órbita, ela deveria ser processada, em treinos, bem antes dos reforços chegarem, mesmo antes do fim do ano; o que não aconteceu. Ou seja, uma fortuna foi gasta de maneira pouco pensada, o que contrasta com a eficiência na gestão anterior de recursos que redundou numa liquidez ímpar na história do clube argentino.
Dentro de campo a criatividade sumiu. A equipe tem sérias dificuldades na distribuição da bola, com poucas opções claras de passes, pois as linhas não são claras para o portador da bola. Disto resulta decisões erradas ou insuficientes. A falta de ideias para romper linhas inimigas gera o toque de bola esvaziados de expetativas. A previsibilidade salta aos olhos dos marcadores, que bloqueiam facilmente as tentativas de construção de jogo ou os poucos ataques que delas resultam. Se há um grave perigo para a essência do jogo propositivo é a presença nele da desordem. Ela desorienta as ações nos momentos da necessária recomposição. Isto é precisamente o que acontece atualmente com o rival do Flamengo. Dentro disso, posse de bola quer dizer muito pouco, pois basta apenas uma delas perdida na fase ofensiva para que seus rivais o consigam golpear com um contragolpe fatal.
Se tais problemas parecem impossíveis de serem solucionados, ao menos a estreia do River ocorre fora de casa, onde o jogo especulativo tende a ser mais eficiente do que o seu contrário. Claro que neste contexto o Flamengo pode tirar vantagens, pois encaixará com mais facilidade uma pressão sobre os argentinos. Porém, uma coisa é pressionar um Boavista, a outra fazê-lo contra um rival do quilate de um River Plate. Ocorre que se há um traço positivo na adoção do jogo especulativo ele está precisamente na observação, da equipe que o adota, sobre quem o pressiona em seu campo de defesa. E o caráter do olhar de jogadores de um time pequeno sempre é menos apurado do que aquele que portam os atletas de uma esquadra de porte.
Intensidade não falta ao River. Problema é o seu caráter. Sobra sangue nos olhos, mas ninguém sabe como canalizá-lo para o futebol propositivo que está no DNA da equipe. O esquema não ajuda, o desentrosamento tampouco. Algo precisa dispará-lo e isto pode contudo aparecer na estreia contra o Flamengo. Trata-se do tal “inimigo invisível”. Na falta de uma configuração sobre o que ele possa ser ao menos vale uma caracterização qualquer.
No momento, de duas semanas para cá, ela tem se construído no discurso de que o mundo está contra o River, que perseguido caminha só, amparado apenas na sua tradição. Conversa? Vão nessa! Grandes ídolos do passado, que sempre palpitam demais canalizam suas observações à necessidade da equipe se reconectar com sua história e levar esta alma de gigante para o jogo. Uma alma gigantesca que não merecia, por exemplo, os prejuízos que a arbitragem tem praticado contra ela. E para tal nada como a péssima arbitragem Jorge Baliño, que fez algo raro: errou e prejudicou a equipe de Gallardo.
Era tudo o que o elenco millonario precisava para atribuir um sentido à intensidade que praticam em campo. O inimigo que era invisível ganha corpo agora no vento que sopra contra e que atenta gravemente à estatura e “dignidade” do clube. E “O vento que sopra contra nossa equipe é preciso ser afrontado de frente. E a partida contra o Flamengo, na quarta, será o momento decisivo para tal”. Este é o cambaleante e perigoso rival que o Rubro-Negro vai recepcionar e tentar superar na noite de hoje? Possível? Quem sabe?
quarta-feira, 22 de novembro de 2017
Dossiê: uma análise completa e detalhada do Atlético Junior, adversário da semifinal da Sul-Americana
Após 16 anos o Flamengo está de volta a uma semifinal de uma competição sul-americana.
Pois bem, o Junior do primeiro semestre não possuía suas duas principais estrelas de agora; porém, tinha lá seus bons jogadores. Foi um fiasco só; terminando na 12ª posição da tabela. Todo mundo riu. Fosse o que fosse, o fato é que “aquilo” não era um time de futebol: era um bando de malucos; pouco além disso. Verdade é que as chegadas de Téo Gutiérrez e Yimmi Chará elevaram o patamar do elenco. Mas é só meia-verdade, pois as contratações não atentariam contra o principal problema do Junior: a indisciplina. E a solução, qual era? A chegada do técnico Julio Comesaña.
O técnico uruguaio, naturalizado colombiano, não é somente um disciplinador implacável. É também destemido. Isto ocorre porque ele é um dos únicos comandantes do banco que conhece e se adapta ao “Tiburón” de Barranquilla. Pobre de alguém que ouse falar mal de Comesaña em algum boteco da principal cidade da Costa Colombiana. Sem ele, Téo, “el Pistolero” Gutiérrez, apenas aprofundaria os problemas disciplinares. Com ele, “el Pistolero” tem feito esforços hercúleos para se manter numa boa. Caldo é quente, no caldeirão de Comesaña.
Junior, no contexto do futebol colombiano
Então, o técnico charrua é um dos poucos que conhece e se adapta a “el Tiburón”... Ora, mas o que o Junior tem de tão especial? A marra.
Principal equipe da Costa Colombina, o Junior de Barranquilla tem apenas sete conquistas nacionais. Atlético Nacional tem 16; Millos, 14; América de Cali, 13 e assim por diante. Vai lá e pergunta em Barranquilla quem é o maior? Fácil pensarmos na resposta do torcedor. Problema é que dirigentes responderiam a mesma coisa. E, pasmem, alguns jornalistas também. Mundo à parte? Bem por aí. Ninguém se importa muito com os rivais do pais e tampouco com suas conquistas. Junior pode ficar 20 anos sem acariciar um caneco e basta chegar perto de um deles para a marra voltar vitaminada. “Somos os melhores, temos a melhor equipe, estamos na mais bonita região do país e a nossa seleção só joga por aqui. Quer mais o quê?”
Com o tempo, essa fama de “folgado” foi se associando às suas principais estrelas. “El Pibe” Valderrama é personagem do “Tiburón”. Craque da seleção que tinha em Rincón e Tino Asprilla dois outros nomes daquela seleção que humilhou a Argentina no Monumental de Núñez, em 1993, “el Pibe” jogava como poucos, mas jogaria como Maradona, se corresse um pouco mais. A pança não deixava, e a folga também. Hoje, vive de “descer a lenha” em todo mundo. Jorge, “el Bolañito” Bolaño, ex-jogador que foi à Copa da França com a seleção cafetera, é outro personagem do Junior. Em 2014, discutiu com a esposa, gritaria foi geral e a polícia baixou no local. Dois policiais tentaram prendê-lo e ele partiu “pra porrada”. Um dos policiais ficou cinco dias sem poder trabalhar.
E claro, não poderíamos deixar de falar dele, o “terror de Avellaneda”, Téo Gutiérrez. Fôssemos relatar aqui tudo o que ele já aprontou por aí, o torcedor do Flamengo não terminaria de ler este texto até a hora da partida de ida, pela Sul-Americana. Em resumo, durante férias em seu país, vestiu e se deixou fotografar com a camisa do Boca Juniors. Ele jogava pelo River. Ano passado, pelo Rosário Central, fez um gol na Bombonera, contra o Boca, e comemorou fazendo um gesto em que desenhava a faixa do River na camisa. Confusão total e dois expulsos. Centurión, pelo Boca, saiu quietinho; Téo, pelo Central, saiu tapando o nariz em referência a presença de merda no ambiente e invocando de forma pejorativa o apelido de “bostero” da equipe xeneize.
Pouco? Pois bem, em 2012, após ser expulso em jogo do Racing, foi questionado por Sebastián Saja, nos vestiário. Não gostou, xingou até a quinta geração da família do goleiro e ainda assim não ficou satisfeito. Foi até o armário e pegou um revólver. Ninguém mais sabia onde Saja foi parar. A única coisa que se ouvia era a voz ensandecida de “el Pistolero”: “cadê o marica, cadê o marica, cadê o marica?”
Daí a importância da presença de Julio Comesaña no comando da equipe. Chegou ao clube no fim da temporada anterior e teve tempo de estudar o elenco, mandar muita gente embora e apontar as contratações necessárias para o novo momento do Junior. De cara, falou que o elenco era ingênuo, composto de jogadores “mansos” e com pouca reação diante de adversidades. “Jogador da equipe é atirado ao chão, se levanta e ainda pede desculpas para todos; para que precisamos de jogadores assim?”. Houve um episódio, na partida contra o Deportivo Cali, em que o meio-campista Fabián Sambueza pisou em Alex Pérez, do Junior, sem que nenhum jogador desta equipe manifestasse qualquer reação. Comesaña se revoltou. “Depois do lance, houve um lateral e Sambueza ficou bem de frente para mim. Eu fixei meu olhar sobre ele e tive vontade de lhe falar umas verdades. Mas que isto: tive um desejo profundo de estar só cinco minutos dentro de campo... porém no momento não vivo mais esta realidade e tampouco posso falar para um jogador da minha equipe que manifeste certa reação; ela há de estar na alma do jogador, no seu caráter, sem que ninguém lhe tenha de apontar o que fazer”. Foi com base neste sentimento que o técnico charrua reformulou o elenco, trazendo jogadores com forte personalidade e caráter futebolístico. Mas como joga o rival do Flamengo nas semifinais da Sul-Americana?
Como joga o Junior de Barranquilla
Esquema preferencial de Comesaña é o 4-4-2, que se modifica para 4-2-3-1, 4,2,1,3, 4-3-3 ou até 4-2-2-2 a depender da necessidade da partida ou na partida. Porém, a base é sempre o 4-4-2. Além disso, mesmo com todas as variações nunca se modifica a presença de uma linha de quatro seguida de um doble 5, composto por Cantillo e Pico, um pouco mais à frente. Essa dupla é um dos segredos do sucesso da equipe colombiana. Ambos são marcadores incansáveis, mas, ao mesmo tempo, jogadores que sabem acelerar o jogo com bons passes. Muitos têm comentado sobre a lesão do zagueiro Jonathan Ávila, mas qualquer um que entre não vai modificar a defesa do Tubarão colombiano. Todos os zagueiros têm um nível parecido, exceto Jefferson Gómez, o melhor de todos, mas ainda jovem e pouco experiente. Por estar lesionado, não irá para o jogo: Junior Arias ocupará a vaga de Ávila. Porém, como dissemos, todos são bem parecidos. Problema mesmo para a defensiva do Junior teria sido perder um dos volantes, Cantillo ou Pico.
Comesaña experimentou vários esquemas e formações, atrelando-as aos mais diferentes jogadores. No fim, manteve no grupo somente aqueles que não perdiam rendimento com a modificação de um esquema para outro. A equipe é muito rápida, com a aceleração do jogo pelos flancos do campo ou por dentro, principalmente com a condução de Chará. Pelo lado direito, o lateral David Murillo apoia muito, sempre aberto, permitindo que Gonzalez ou Chará se transformem em meio-campistas a percorrer o campo em diagonal rumo à área do adversário. Quando isto acontece, o Junior chega à área com até cinco “atacantes”. Gonzalez é um jogador em ascensão, tem faro de gol, está com moral e, bem ao estilo do que gosta Comesaña, é polivalente, podendo aparecer como extremo pelo lado esquerdo ou como segundo atacante. Outro em ascensão, e que joga pelo setor, é o garoto Luiz Díaz, que desbancou o badalado Léiner Escalante.
Pelo lado esquerdo, a situação não é muito diferente, German Gutiérrez também apoia sempre, permitindo que o extremo do setor se infiltre pelo centro da área. O melhor jogador do Junior para ocupar o setor é Jarlan Barrera, jovem revelação colombiana. Contudo, seus altos e baixos, além da condição física, o têm deixado no banco, na maior parte do tempo. Isto é bom para o Flamengo, pois quando o jogo dinâmico de Barrera acontece, fica difícil de marca-lo.
Ofensividade e dinamismo do meio-campo para frente dificultam o encaixe defensivo de qualquer adversário do Junior. Trata-se de toque de bola em alta velocidade, na fase ofensiva, principalmente quando a equipe atua fora de Barranquilla. O trabalho com a bola tende a ser mais pausado, quando a equipe atua em seus domínios. Neste caso, o homem que quebra as linhas de marcação é Yimmi Chará, o melhor e mais importante jogador do Junior de Barranquillla.
Yimmi Chará, o segredo do Junior
Chará praticamente começou sua carreira naquele Tolima que eliminou o Corinthians da Libertadores, em 2011. Atua por todos os setores do meio-campo, como segundo atacante ou até de falso nove. “El Depredador” Chará é o jogador com o qual a defesa flamenguista precisará se preocupar. Difícil marca-lo, pois ele sempre está em todos os lugares, preferencialmente alternando posição com um dos extremos ou mesmo retirando Téo Guetiérrez da área e aparecendo no seu interior para arrematar. Sua parceria com “el Pistolero” fez do Tiburón o ataque mais letal do Colombiano e dele, Chará, o artilheiro da competição.
Não bastasse a velocidade de sua movimentação, Chará é o responsável por ditar as trocas de posições do meio-campo para frente. Sua disciplina tática impressiona tanto quanto sua ousadia. Mas, diferentemente de outros jogadores da equipe, dificilmente se envolve em confusões. Se o rival do Flamengo é tido como uma equipe extremamente ofensiva isto se dá pela presença de “el Predador” Chará, embora não somente por ela.
Teo Gutiérrez em grande fase
Possível falar quaisquer coisas sobre Teófilo, mas é inegável que se trata de um excelente atacante. Sua parceria com Chará é o ponto alto do ataque também porque Gutiérrez, dentro de campo, e querendo jogar futebol, é um jogador inteligente. Sua presença abre possibilidades as mais diversas, como a entrada de Roberto Ovelar, centroavante de área, que permite a Teo circular fora dela e se transformar em assistente para gols. Além de Ovelar, e o próprio Chará, González ou Díaz também se beneficiam com o trabalho de “meio-campista” do antigo camisa 9 do Racing.
Por certo que Teo já arrumou problemas. Recentemente, Ovelar foi à direção do Junior mostrar o celular da esposa, a modelo Gladiz Ortega, com mensagens do “Pistolero de Avellaneda”. Não vamos engrossar o coro de “pudera”, no caso, pois este texto se pretende sério, assim como os rumos que a situação tomou na equipe da Costa Caribenha. Todavia, o técnico Comesaña tomou a dianteira e foi logo dizendo: “pouco importa o justo ódio entre vocês, mas eu vou dar porrada no primeiro que boicotar minha equipe dentro de campo!”. Dito e feito, o episódio em nada afetou o trabalho e a parceira dos atacantes, ao menos nos treinos que realizaram juntos.
Dicas para o Fla
Infelizmente nenhum atacante rubro-negro prende tanto os laterais na defesa quanto Berrio. Este trabalho é necessário e vital se o Fla deseja não ser surpreendido no Rio. Nada a ver com a grande qualidade desses laterais, embora pela direita Murillo viva o melhor momento de sua carreira.
Problema é que quando eles apoiam os dois ponteiros se transformam em meia-atacantes com forte chegada à área. Melhor forma de combater a jogada é prender o Junior no seu campo de defesa, com dois extremos bem abertos e atuantes. Sim, atuantes, pois não é jogo para modorra dentro de campo.
Melhor forma de marcar “el Predador” Chará é impedindo que a redonda chegue a seus pés. Muitas vezes ele recua para buscar essa bola junto a Cantillo ou Pico. Como dito acima; são dois volantes de marcação, mas que sabem oferecer o passe limpo. Este passe precisa de corte, quando a redonda for endereçada a Chará. Este é também o principal ladrão de bola da equipe do meio-campo para frente. Daí que a saída de bola vai precisar do comando e lucidez de Cuéllar. Fosse outro tempo e a coisa poderia se complicar.
O sistema defensivo do Junior é bom, mas seus defensores nem tanto. Como imaginamos que o Flamengo tomará as rédeas da partida, é possível que o Junior proteja melhor sua primeira linha, povoando o setor, na fase defensiva. Desta forma, a equipe rubro-negra precisará de jogadores com dribles que possam quebrar a barreira defensiva à frente da área do bom goleiro Sebá Vieira. Já em Barranquilla, atacantes velozes se farão mais necessários, já que o conjunto brasileiro optará pelo jogo do contragolpe.
O Junior encara a partida como duelo de “cachorro grande”. Pela marra histórica de “el Tiburón”, e pelo caráter de seus jogadores, vai ser desta forma que a equipe colombiana vai se comportar. Natural que esperemos do Flamengo uma atitude no mínimo parecida.
Nesta quinta-feira, o Rubro Negro entra em campo no Maracanã para enfrentar o Atlético Junior. Na semana que vem acontecerá a partida de volta, em Barrinquilla.
Para conhecer mais sobre esse adversário, o colaborador do blog, Joza Novalis, faz uma análise completa e detalhada.
Confira:
O rival do Flamengo nas semifinais da Copa Sul-Americana é uma equipe nova, cujo desenho atual foi montado no início do segundo semestre, a partir da chegada do técnico Júlio Comesaña. Por certo que a realidade do “Tiburón” desautoriza o comentário anterior. “Como assim, equipe nova, se tá jogando o fino da bola?” Ocorre que grande parte dos jogadores já estava no elenco. Atletas que saíram calibraram o conjunto; os que chegaram também: na mesma.
O rival do Flamengo nas semifinais da Copa Sul-Americana é uma equipe nova, cujo desenho atual foi montado no início do segundo semestre, a partir da chegada do técnico Júlio Comesaña. Por certo que a realidade do “Tiburón” desautoriza o comentário anterior. “Como assim, equipe nova, se tá jogando o fino da bola?” Ocorre que grande parte dos jogadores já estava no elenco. Atletas que saíram calibraram o conjunto; os que chegaram também: na mesma.
Pois bem, o Junior do primeiro semestre não possuía suas duas principais estrelas de agora; porém, tinha lá seus bons jogadores. Foi um fiasco só; terminando na 12ª posição da tabela. Todo mundo riu. Fosse o que fosse, o fato é que “aquilo” não era um time de futebol: era um bando de malucos; pouco além disso. Verdade é que as chegadas de Téo Gutiérrez e Yimmi Chará elevaram o patamar do elenco. Mas é só meia-verdade, pois as contratações não atentariam contra o principal problema do Junior: a indisciplina. E a solução, qual era? A chegada do técnico Julio Comesaña.
O técnico uruguaio, naturalizado colombiano, não é somente um disciplinador implacável. É também destemido. Isto ocorre porque ele é um dos únicos comandantes do banco que conhece e se adapta ao “Tiburón” de Barranquilla. Pobre de alguém que ouse falar mal de Comesaña em algum boteco da principal cidade da Costa Colombiana. Sem ele, Téo, “el Pistolero” Gutiérrez, apenas aprofundaria os problemas disciplinares. Com ele, “el Pistolero” tem feito esforços hercúleos para se manter numa boa. Caldo é quente, no caldeirão de Comesaña.
Junior, no contexto do futebol colombiano
Então, o técnico charrua é um dos poucos que conhece e se adapta a “el Tiburón”... Ora, mas o que o Junior tem de tão especial? A marra.
Principal equipe da Costa Colombina, o Junior de Barranquilla tem apenas sete conquistas nacionais. Atlético Nacional tem 16; Millos, 14; América de Cali, 13 e assim por diante. Vai lá e pergunta em Barranquilla quem é o maior? Fácil pensarmos na resposta do torcedor. Problema é que dirigentes responderiam a mesma coisa. E, pasmem, alguns jornalistas também. Mundo à parte? Bem por aí. Ninguém se importa muito com os rivais do pais e tampouco com suas conquistas. Junior pode ficar 20 anos sem acariciar um caneco e basta chegar perto de um deles para a marra voltar vitaminada. “Somos os melhores, temos a melhor equipe, estamos na mais bonita região do país e a nossa seleção só joga por aqui. Quer mais o quê?”
Com o tempo, essa fama de “folgado” foi se associando às suas principais estrelas. “El Pibe” Valderrama é personagem do “Tiburón”. Craque da seleção que tinha em Rincón e Tino Asprilla dois outros nomes daquela seleção que humilhou a Argentina no Monumental de Núñez, em 1993, “el Pibe” jogava como poucos, mas jogaria como Maradona, se corresse um pouco mais. A pança não deixava, e a folga também. Hoje, vive de “descer a lenha” em todo mundo. Jorge, “el Bolañito” Bolaño, ex-jogador que foi à Copa da França com a seleção cafetera, é outro personagem do Junior. Em 2014, discutiu com a esposa, gritaria foi geral e a polícia baixou no local. Dois policiais tentaram prendê-lo e ele partiu “pra porrada”. Um dos policiais ficou cinco dias sem poder trabalhar.
E claro, não poderíamos deixar de falar dele, o “terror de Avellaneda”, Téo Gutiérrez. Fôssemos relatar aqui tudo o que ele já aprontou por aí, o torcedor do Flamengo não terminaria de ler este texto até a hora da partida de ida, pela Sul-Americana. Em resumo, durante férias em seu país, vestiu e se deixou fotografar com a camisa do Boca Juniors. Ele jogava pelo River. Ano passado, pelo Rosário Central, fez um gol na Bombonera, contra o Boca, e comemorou fazendo um gesto em que desenhava a faixa do River na camisa. Confusão total e dois expulsos. Centurión, pelo Boca, saiu quietinho; Téo, pelo Central, saiu tapando o nariz em referência a presença de merda no ambiente e invocando de forma pejorativa o apelido de “bostero” da equipe xeneize.
Pouco? Pois bem, em 2012, após ser expulso em jogo do Racing, foi questionado por Sebastián Saja, nos vestiário. Não gostou, xingou até a quinta geração da família do goleiro e ainda assim não ficou satisfeito. Foi até o armário e pegou um revólver. Ninguém mais sabia onde Saja foi parar. A única coisa que se ouvia era a voz ensandecida de “el Pistolero”: “cadê o marica, cadê o marica, cadê o marica?”
Daí a importância da presença de Julio Comesaña no comando da equipe. Chegou ao clube no fim da temporada anterior e teve tempo de estudar o elenco, mandar muita gente embora e apontar as contratações necessárias para o novo momento do Junior. De cara, falou que o elenco era ingênuo, composto de jogadores “mansos” e com pouca reação diante de adversidades. “Jogador da equipe é atirado ao chão, se levanta e ainda pede desculpas para todos; para que precisamos de jogadores assim?”. Houve um episódio, na partida contra o Deportivo Cali, em que o meio-campista Fabián Sambueza pisou em Alex Pérez, do Junior, sem que nenhum jogador desta equipe manifestasse qualquer reação. Comesaña se revoltou. “Depois do lance, houve um lateral e Sambueza ficou bem de frente para mim. Eu fixei meu olhar sobre ele e tive vontade de lhe falar umas verdades. Mas que isto: tive um desejo profundo de estar só cinco minutos dentro de campo... porém no momento não vivo mais esta realidade e tampouco posso falar para um jogador da minha equipe que manifeste certa reação; ela há de estar na alma do jogador, no seu caráter, sem que ninguém lhe tenha de apontar o que fazer”. Foi com base neste sentimento que o técnico charrua reformulou o elenco, trazendo jogadores com forte personalidade e caráter futebolístico. Mas como joga o rival do Flamengo nas semifinais da Sul-Americana?
Como joga o Junior de Barranquilla
Esquema preferencial de Comesaña é o 4-4-2, que se modifica para 4-2-3-1, 4,2,1,3, 4-3-3 ou até 4-2-2-2 a depender da necessidade da partida ou na partida. Porém, a base é sempre o 4-4-2. Além disso, mesmo com todas as variações nunca se modifica a presença de uma linha de quatro seguida de um doble 5, composto por Cantillo e Pico, um pouco mais à frente. Essa dupla é um dos segredos do sucesso da equipe colombiana. Ambos são marcadores incansáveis, mas, ao mesmo tempo, jogadores que sabem acelerar o jogo com bons passes. Muitos têm comentado sobre a lesão do zagueiro Jonathan Ávila, mas qualquer um que entre não vai modificar a defesa do Tubarão colombiano. Todos os zagueiros têm um nível parecido, exceto Jefferson Gómez, o melhor de todos, mas ainda jovem e pouco experiente. Por estar lesionado, não irá para o jogo: Junior Arias ocupará a vaga de Ávila. Porém, como dissemos, todos são bem parecidos. Problema mesmo para a defensiva do Junior teria sido perder um dos volantes, Cantillo ou Pico.
Comesaña experimentou vários esquemas e formações, atrelando-as aos mais diferentes jogadores. No fim, manteve no grupo somente aqueles que não perdiam rendimento com a modificação de um esquema para outro. A equipe é muito rápida, com a aceleração do jogo pelos flancos do campo ou por dentro, principalmente com a condução de Chará. Pelo lado direito, o lateral David Murillo apoia muito, sempre aberto, permitindo que Gonzalez ou Chará se transformem em meio-campistas a percorrer o campo em diagonal rumo à área do adversário. Quando isto acontece, o Junior chega à área com até cinco “atacantes”. Gonzalez é um jogador em ascensão, tem faro de gol, está com moral e, bem ao estilo do que gosta Comesaña, é polivalente, podendo aparecer como extremo pelo lado esquerdo ou como segundo atacante. Outro em ascensão, e que joga pelo setor, é o garoto Luiz Díaz, que desbancou o badalado Léiner Escalante.
Pelo lado esquerdo, a situação não é muito diferente, German Gutiérrez também apoia sempre, permitindo que o extremo do setor se infiltre pelo centro da área. O melhor jogador do Junior para ocupar o setor é Jarlan Barrera, jovem revelação colombiana. Contudo, seus altos e baixos, além da condição física, o têm deixado no banco, na maior parte do tempo. Isto é bom para o Flamengo, pois quando o jogo dinâmico de Barrera acontece, fica difícil de marca-lo.
Ofensividade e dinamismo do meio-campo para frente dificultam o encaixe defensivo de qualquer adversário do Junior. Trata-se de toque de bola em alta velocidade, na fase ofensiva, principalmente quando a equipe atua fora de Barranquilla. O trabalho com a bola tende a ser mais pausado, quando a equipe atua em seus domínios. Neste caso, o homem que quebra as linhas de marcação é Yimmi Chará, o melhor e mais importante jogador do Junior de Barranquillla.
Yimmi Chará, o segredo do Junior
Chará praticamente começou sua carreira naquele Tolima que eliminou o Corinthians da Libertadores, em 2011. Atua por todos os setores do meio-campo, como segundo atacante ou até de falso nove. “El Depredador” Chará é o jogador com o qual a defesa flamenguista precisará se preocupar. Difícil marca-lo, pois ele sempre está em todos os lugares, preferencialmente alternando posição com um dos extremos ou mesmo retirando Téo Guetiérrez da área e aparecendo no seu interior para arrematar. Sua parceria com “el Pistolero” fez do Tiburón o ataque mais letal do Colombiano e dele, Chará, o artilheiro da competição.
Não bastasse a velocidade de sua movimentação, Chará é o responsável por ditar as trocas de posições do meio-campo para frente. Sua disciplina tática impressiona tanto quanto sua ousadia. Mas, diferentemente de outros jogadores da equipe, dificilmente se envolve em confusões. Se o rival do Flamengo é tido como uma equipe extremamente ofensiva isto se dá pela presença de “el Predador” Chará, embora não somente por ela.
Teo Gutiérrez em grande fase
Possível falar quaisquer coisas sobre Teófilo, mas é inegável que se trata de um excelente atacante. Sua parceria com Chará é o ponto alto do ataque também porque Gutiérrez, dentro de campo, e querendo jogar futebol, é um jogador inteligente. Sua presença abre possibilidades as mais diversas, como a entrada de Roberto Ovelar, centroavante de área, que permite a Teo circular fora dela e se transformar em assistente para gols. Além de Ovelar, e o próprio Chará, González ou Díaz também se beneficiam com o trabalho de “meio-campista” do antigo camisa 9 do Racing.
Por certo que Teo já arrumou problemas. Recentemente, Ovelar foi à direção do Junior mostrar o celular da esposa, a modelo Gladiz Ortega, com mensagens do “Pistolero de Avellaneda”. Não vamos engrossar o coro de “pudera”, no caso, pois este texto se pretende sério, assim como os rumos que a situação tomou na equipe da Costa Caribenha. Todavia, o técnico Comesaña tomou a dianteira e foi logo dizendo: “pouco importa o justo ódio entre vocês, mas eu vou dar porrada no primeiro que boicotar minha equipe dentro de campo!”. Dito e feito, o episódio em nada afetou o trabalho e a parceira dos atacantes, ao menos nos treinos que realizaram juntos.
Dicas para o Fla
Infelizmente nenhum atacante rubro-negro prende tanto os laterais na defesa quanto Berrio. Este trabalho é necessário e vital se o Fla deseja não ser surpreendido no Rio. Nada a ver com a grande qualidade desses laterais, embora pela direita Murillo viva o melhor momento de sua carreira.
Problema é que quando eles apoiam os dois ponteiros se transformam em meia-atacantes com forte chegada à área. Melhor forma de combater a jogada é prender o Junior no seu campo de defesa, com dois extremos bem abertos e atuantes. Sim, atuantes, pois não é jogo para modorra dentro de campo.
Melhor forma de marcar “el Predador” Chará é impedindo que a redonda chegue a seus pés. Muitas vezes ele recua para buscar essa bola junto a Cantillo ou Pico. Como dito acima; são dois volantes de marcação, mas que sabem oferecer o passe limpo. Este passe precisa de corte, quando a redonda for endereçada a Chará. Este é também o principal ladrão de bola da equipe do meio-campo para frente. Daí que a saída de bola vai precisar do comando e lucidez de Cuéllar. Fosse outro tempo e a coisa poderia se complicar.
O sistema defensivo do Junior é bom, mas seus defensores nem tanto. Como imaginamos que o Flamengo tomará as rédeas da partida, é possível que o Junior proteja melhor sua primeira linha, povoando o setor, na fase defensiva. Desta forma, a equipe rubro-negra precisará de jogadores com dribles que possam quebrar a barreira defensiva à frente da área do bom goleiro Sebá Vieira. Já em Barranquilla, atacantes velozes se farão mais necessários, já que o conjunto brasileiro optará pelo jogo do contragolpe.
O Junior encara a partida como duelo de “cachorro grande”. Pela marra histórica de “el Tiburón”, e pelo caráter de seus jogadores, vai ser desta forma que a equipe colombiana vai se comportar. Natural que esperemos do Flamengo uma atitude no mínimo parecida.
quarta-feira, 9 de agosto de 2017
O que esperar de Reinaldo Rueda, por Joza Novalis
Reinaldo Rueda está muito perto de ser o novo treinador do Flamengo.
O colombiano levou o Atlético Nacional ao título da Libertadores de 2016, com um futebol de encher os olhos. Em dois anos, foi por duas vezes campeão colombiano (2015 e 2017), uma Copa da Colômbia, 2016, uma Superliga da Colômbia (2016) e a Recopa Sul-Americana (2017).
O que esperar de Rueda? Qual suas características? Qual expectativa para a chegada de um treinador no meio da temporada? Esquema de jogo?
Nada melhor para falar sobre o assunto do que Joza Novalis (@jozanovalis). Que já foi entrevistado aqui no Ninho sobre a participação do Flamengo na Libertadores em 2017 - que se encerrou de forma patética e escreveu de forma magnífica sobre a contratação de Orlando Berrío.
Eis Reinaldo Rueda, por Joza Novalis:
Reinaldo Rueda é apontado como um dos favoritos para assumir o banco de reservas do Flamengo. Colombiano de 60 anos, Rueda é tido como um estudioso do futebol. Porém é bem mais que isto. Uma coisa é estudar, pegar em livros ou “colar” em profissionais e técnicos famosos apenas para confirmar o que se sabe ou o que se pensa saber; outra, bem diversa, é fazer a mesma empreitada tendo profunda consciência de estudante; alguém humilde e que ainda se encanta diante do conhecimento emitido por um mestre. Este é Reinaldo Rueda. Na Alemanha, todos são elogios para o ex-comandante do Atlético Nacional em virtude de sua humildade, gentileza e refino no trato com as pessoas. Quem o vê, e não o conhece bem, chega a duvidar de suas inúmeras conquistas ao longo da carreira. Mas, enfim, Rueda daria certo, se confirmado como técnico do Flamengo? Possível que sim. Vejamos, então, de quem se trata, sua visão de futebol, suas preferências e se de fato seria uma boa para o Rubro-Negro carioca.
Dispensável falar de suas conquistas, até os mais leigos se lembram de algumas. Melhor pontuarmos alguns fatores que o levaram a elas. Em 2007, seus estudos já o encaminhavam para uma carreira importante, era comandante do banco da seleção de Honduras, conduzida por ele, tempos depois, para a Copa do Mundo da África do Sul. Contudo, sua visão de futebol era voltada para a armação de equipes defensivas. Foi então que conheceu seu assistente técnico atual, Bernardo Redín. As duas mentalidades eram bem diferentes, pois Redín, embora ainda fosse um estudioso do assunto, era já um adorador do futebol ofensivo. O mais lógico era que o assistente fosse influenciado por quem o empregava, mas foi o contrário. Redín modificou a visão de Rueda, mostrando-lhe as vantagens de armar uma equipe voltada para a construção do jogo ofensivo. Rueda já era um profissional atento aos atletas, mas se impressionou com a meticulosidade com a qual Redín percebia os limites de um jogador e criava um plano para corrigi-los. Este foi outro traço do assistente que Rueda assimilou à sua prática profissional. Redín ficou ao lado de Rueda até 2014, quando foi anunciado como técnico do Monagas, da Venezuela. Porém, assim que assumiu o Atlético Nacional, Rueda chamou seu assistente de volta.
No Atlético Nacional, a impressão era a de que qualquer treinador estaria fadado ao fracasso, após a gestão impecável de Juan Carlos Osório. Rueda decidiu manter o estilo de jogo de Osório, modificando e fortalecendo a zaga, com a adoção da linha de quatro. Porém, manteve a saída da bola pela defesa, com a aproximação do volante para recebê-la e favorecer as triangulações. Além disso, treinou seus zagueiros para o lançamento da bola, que em geral era cruzado. Se Henríquez estava mais à direita, o lançamento buscava o extremo esquerdo; se na esquerda, seus lançamentos buscavam o extremo do setor direito. Em geral, o resultado era positivo, pois com a proximidade de um, e às vezes de dois volantes, à primeira linha, os defensores e principalmente volantes rivais eram surpreendidos com os lançamentos a partir da zaga. Além disso, um plano individual foi adotado para a qualificação técnica de cada jogador, principalmente aqueles que estavam no banco ou na fila para serem promovidos à equipe principal. Bernardo Redín se ocupou, por exemplo, de Berrio e seu treinamento foi vital para que o atacante flamenguista aprendesse a trocar o lado do campo, entrar em diagonal, jogar de 9 e qualificar o passe curto nas imediações ou dentro da área. Não bastasse isto e um plano de adaptação ao estilo da equipe foi adotado para os jogadores que chegassem ao Atlético Nacional. Tudo isto o Flamengo também ganhará, caso confirme Rueda.
Durante o tempo que ficou no Atlético Nacional Rueda demonstrou ser um perito em gerir plantel numeroso e qualificado. Isto ocorre, em parte, porque todos os atletas são testados quanto ao conhecimento e assimilação da proposta. Testados durante as partidas, as conversas prévias e o balanço dos erros e acertos, após os jogos. Tudo é muito claro e feito às vistas de todos, o que torna quase impossível a contestação de possíveis descontentes. Outro aspecto que faz de Rueda um bom gerente de elenco é que sua presença agrega aos jogadores uma mentalidade vencedora. Sim, muitos podem tentar o mesmo com sua fala pensada (ou não) aos seus atletas do elenco. Mas sabemos que uma coisa é o jogador olhar para um técnico esforçado e outra é olhar para um vencedor. O respeito é outro
Flamengo precisa de um técnico inteligente
Se há um debate impróprio na mídia é aquele que pauta treinador estudioso versus treinador “boleiro”. Quando pensamos neste último, possível que nos lembremos de Renato Portaluppi. Provável que aqueles que creem que ele não estuda, ou não é assessorado por vastos estudos, se enganem. Futebol moderno não admite mais um “boleiro” qualquer, principalmente em time grande. Flamengo precisa de um técnico inteligente, pois o caráter do seu elenco o exige. Quando o jogador sabe de cor o que o técnico vai dizer, ele não o escuta. E se não escuta é natural que pouco a pouco, e mesmo contra sua vontade, deixe de respeitá-lo. Todo atleta tem em sua cabeça uma ideia de jogo ou no mínimo pistas de como solucionar problemas durante uma partida. Errado ou certo, o atleta só abandonará sua visão, em prol da orientação do técnico, caso esta orientação o surpreenda. Para tanto, o discurso do comandante precisa renovar-se o tempo todo e materializar seus conhecimentos e a ampliação desses conhecimentos aos “olhos” do jogador. Caso esta não seja a situação, é até provável que os problemas não apareçam quando o time estiver ganhando. Porém, quando a equipe começar a perder a “coisa” muda de figura.
Todo ato rebelde de um jogador tende a começar na rejeição do padrão de orientação de seu comandante. Daí para formação de grupinhos é um piscar de olhos. E há situações, sabemos ou desconfiamos, em que o próprio treinador, perdido em seu papel de técnico, troca o comando da equipe pelo comando de algum grupinho formado pelos por ele ou pelos atletas. Portanto, quanto mais o elenco for qualificado tecnicamente e possuir jogadores inteligentes, mais ele necessitará de um técnico inteligente, estudioso e vencedor. Neste sentido, Rueda também se perfila como nome ideal para o Rubro-Negro.
O passador, o passe-surpresa e os recebedores
Treinadores da escola de Bielsa refletem a todo instante sobre o passe dentro de uma partida. Rueda não é um seguidor puro do “el Loco”, pois seu repertório inclui outros, como Ancelotti, Del Bosque e Osório, de quem (e às vezes indiretamente, através de Bernardo Redín),filtra os principais traços do bielsismo na sua filosófica de jogo. Pois bem, para esses treinadores, o passe é o que há de mais importante no futebol.
O passe preconiza basicamente que a bola chegue de forma segura ao seu recebedor. Dentre os dois tipos que há, é óbvio que a conexão da bola entre passador e receptor se realiza de forma tranquila no chamado passe simples. Este tem sua utilidade, mas sua importância é limitada no sentido de que serve só para quebrar a pressão do rival e para a manutenção da bola enquanto não se configura uma situação oportuna para o chamado segundo tipo de passe, o decisivo, aquele que resolve.
Especialmente durante seu tempo no Atlético Nacional, Rueda se ateve muito à reflexão sobre o caráter do passe. Inteligente que é, concluiu pela obviedade de que o passe decisivo é o mais importante e de que o passador precisa contar com uma visão periférica lapidada de forma a entender a fuga da marcação de seus companheiros próximos ou distantes. Todavia, concluiu também por algo não tão óbvio, o fato de que o melhor passe é aquele que chega aonde o receptor determina, e não o contrário. Efeito disso é que com o treinamento correto, e exaustivo, o jogo inteligente se amplia, ganhando terreno não só na mente do passador, mas também dos receptores da bola. A partir daí, e sob a supervisão de Redín, Reinaldo Rueda revolucionou os treinos no Atlético Nacional.
Técnico estrangeiro no meio da temporada
Atualmente, se o nome de um técnico estrangeiro é apontado como possível ocupante do banco de uma equipe brasileira, logo surge o argumento de que ele não teria tempo para se adaptar, já que estamos no meio da temporada. Antes de examinarmos a questão, vale lembrar que ela é resultado de outra anterior, a de que um técnico de fora não dá certo no futebol brasileiro. Engraçado como muitos ainda enchem o peito para falar “futebol brasileiro”, como se ainda fôssemos, no contexto do futebol mundial, algo além de um retrato que se desbota na parede.
Pois bem, técnico estrangeiro no meio de temporada é uma fria, mas brasileiro também é. Fatores circunstanciais parecem primar sobre sucessos ou insucessos na troca de técnico no meio de temporada. Se não for assim, Levir Culpi, Autuori e Mancini são gênios, enquanto Dorival Junior, Eduardo Baptistas e Alexandre Gallo, toscos. Apenas três exemplos que pautam as situações de Santos, Atlético-PR e Vitória, após suas trocas de treinadores: há outros. Ora, vejamos, se conhecimento e intimidade com o futebol brasileiro são vitais, por quais motivos então um técnico novo em um clube, como Dorival Junior, atualmente no São Paulo, não dava jeito no Santos? Por que Mancini não praticou na Chapecoense os “milagres” que tem praticado no Vitória? Na verdade, números mostram que com exceção de Tite, nossos técnicos “de ponta” se equivalem.
A outra questão é que técnico estrangeiro não serve para o futebol nacional. Se isto é uma verdade, ela está pela metade, pois técnico brasileiro também não serve. Tempo médio de nossos técnicos nos clubes ilustram bem a afirmação. Esta situação escancara o que se espera de um comandante do banco de reservas: que faça milagres. Não há tempo para seu trabalho ea pressão que sofre é ininterrupta embora se transvista, após as primeiras derrotas, em apoio para inglês ver. Porém, não sejamos totalmente inflexíveis frente a uma triste realidade: tempo ideal para um treinador realizar o seu trabalho e construir uma equipe vencedora, no Brasil, não existe. Sendo assim, é necessário reconhecermos que os técnicos tradicionais, e que praticam o “mesmo”, apenas perpetuam o ciclo vicioso de suas contratações e demissões, nos clubes do país.Então, um ideal mais aceitável sobe ao palco: o de que um técnico diferenciado, com ideias novas e com amplo conhecimento teórico e prático de futebol converta o tempo longo das conquistas em tempo médio. Por isso Rueda seria bem-vindo ao Flamengo. Jorginho, Carpegiani e outros nomes que se especulam são, com todo o respeito, “o mesmo”; Rueda é o diferente.
Difícil determinar o que é tempo ideal para um técnico comandar no Brasil e obter êxitos, mas 14 meses, ofertados a Zé Ricardo, parecem suficientes; pode não ser o chamado tempo longo, mas, no mínimo, é um senhor tempo médio para um técnico de ponta. Se Reinaldo Rueda se perfila como um treinador acima da média, e se a ele for ofertado um tempo parecido e até menor do que o oferecido a Zé Ricardo, ele tem tudo para triunfar no banco de reservas do Flamengo.
Esquema de jogo
Rueda é um adorador do 4-2-3-1, com dois volantes como peças vitrais da geração do jogo. Os dois laterais tendem a ser, primeiro, laterais, depois, apoiadores. Podem e devem apoiar, mas sem custos para o exercício da tarefa defensiva da equipe. Não estamos falando de laterais-zagueiros, pelo contrário até. Porém, são dos laterais que Rueda mais cobra atenção à parte defensiva. Depois destes, veem os volantes, de quem o sistema exige múltiplas funções, como a do tradicional auxílio aos laterais.
Os dois volantes precisam de mobilidade entre os zagueiros e a linha de três, mais à frente. No sistema, um deles recua para facilitar as triangulações e gerar uma saída com progressão em linha. Este jogador poderia ser Ronaldo ou Cuéllar. O campo se amplia para o passe, mas a bola vai circular numa linha horizontal até que o segundo volante a receba, se posicionando já como primeiro homem do setor criativo, ou ainda quando a bola for lançada diretamente para o meia centralizado e principal responsável pela criação das jogadas ofensivas. É vital para o sistema de Rueda que o passe saia limpo de seus volantes, pois se por um lado estes estão diretamente envolvidos na criação das jogadas, por outro, seus erros de passe podem ser o calcanhar de Aquiles do sistema defensivo.
Em situações de extrema necessidade, veremos uma transição ofensiva com 2-1-4-3, na qual dois zagueiros suportam um volante, enquanto o outro vira um meio-campista. Este jogador terá a seu lado um meia de origem e dois interinos, que são os laterais. A compactação vai saltar aos olhos, porém, uma pouco à frente veremos os dois extremos convertidos em atacantes, ao lado do camisa 9. Em tal contexto passador e receptor se confundem e a movimentação torna-se fluida e incessante, com ou sem a bola e tanto da parte dos passadores quanto dos receptores da redonda. Os ponteiros trocam de posições ou entram na área em diagonal, dificultando a marcação rival. Prioriza-se passe curto entre as linhas, contudo, por vezes, um passe final e decisivo surge justo do volante que se coloca à frente dos zagueiros. Este sistema cobrará do centroavante significativa precisão para entrar e sair da área, pivoteando e abrindo espaços para os dois pontas. Sabemos que Guerrero pode ser este jogador.
Uma linha de três sem Diego?
Provável. Há poucos técnicos tão flexíveis quanto Reinaldo Rueda, porém é a custos que ele abandona o 4-2-3-1. Com sua chegada, Berrio deverá ser o extremo pelo setor direito, pois sua associação com o lateral tecnicamente era um dos pontos fortes do campeão da Libertadores. Importa bem para o sistema que o extremo seja criativo, porém importa mais que ele tenha velocidade e até força física na execução de suas tarefas em campo. Para que o setor tenha um meia-atacante que se notabilize pela criatividade ele precisa exercê-la em altíssimo nível, de forma a compensar suas deficiências defensivas. E se este é o ponto, ele se complica ainda mais pelo fato de que pelo setor esquerdo Trauco não é um bom marcador.
Por outro lado, a linha de três exige um meia centralizado que saiba trabalhar atrás dos extremos. Este jogador há de ter uma visão periférica e precisa pensar rápido para gerar passes que quebrem as linhas defensivas e encontrem os atacantes em espaços vazios. Deste jogador o sistema exige uma alta velocidade de raciocínio e escolhas; sua mente precisa ter a velocidade física de um Orlando Berrio. No Atlético Nacional, este papel era exercido por Macnelly Torres, atleta que fisicamente nunca foi dos mais velozes. No entanto, nas situações de contragolpe ele era preciso nos passes longos no costado da zaga, em geral cruzados, e que deixavam Borja na cara do gol. Sua velocidade de raciocínio se fazia indispensável para o sucesso das jogadas. Percebemos que Everton Ribeiro pode ser um ponta-articulador dos bons, e que também pode atuar pelo setor esquerdo. Porém, dada à sua condição de principal passador da equipe, é bem provável que Rueda o utilize centralizado, no lugar ocupado hoje por Diego.
Alternativa seria modificar o sistema para um 4-1-4-1. Mas se há uma grande vantagem em um elenco qualificado é que ele oferece opções para o técnico praticar o esquema que mais lhe convém. Diego poderia ser recuado para segundo volante. E pode. Mas, como vimos acima, é exigido dos volantes um altíssimo comprometimento também com a marcação. Desta forma, tudo indica que Diego possa ir para o banco de reservas.
Se confirmado Rueda...
Chegada de Rueda pode significar uma mudança real de patamar no Flamengo. O clube da Gávea teria no seu banco de reservas um dos mais inteligentes e vencedores técnicos das Américas. Teria uma equipe que joga da mesma forma dentro e fora de campo, o que contribui para assegurar a identidade futebolística da equipe e nutrir seu DNA de personalidade. Além disso, o clube poderia ser estimulado a investir pesado nas suas estruturas e no treinamento sofisticado de seus atletas, até mesmo os das categorias de base. Os assistentes de Rueda são todos eles profissionais sofisticados. Dentre eles, está Eduardo Velascos, tido como o melhor preparador de goleiros da Colômbia, e profissional com vários convites recusados para trabalhar no futebol europeu. Então, se for o caso de Reinaldo Rueda ser confirmado como o novo técnico,que ele tenha sorte, assim como o Flamengo em seu caminho. Caminho que de fato se anunciaria como novo, diferenciado e promissor.
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O colombiano levou o Atlético Nacional ao título da Libertadores de 2016, com um futebol de encher os olhos. Em dois anos, foi por duas vezes campeão colombiano (2015 e 2017), uma Copa da Colômbia, 2016, uma Superliga da Colômbia (2016) e a Recopa Sul-Americana (2017).
O que esperar de Rueda? Qual suas características? Qual expectativa para a chegada de um treinador no meio da temporada? Esquema de jogo?
Nada melhor para falar sobre o assunto do que Joza Novalis (@jozanovalis). Que já foi entrevistado aqui no Ninho sobre a participação do Flamengo na Libertadores em 2017 - que se encerrou de forma patética e escreveu de forma magnífica sobre a contratação de Orlando Berrío.
Eis Reinaldo Rueda, por Joza Novalis:
Reinaldo Rueda é apontado como um dos favoritos para assumir o banco de reservas do Flamengo. Colombiano de 60 anos, Rueda é tido como um estudioso do futebol. Porém é bem mais que isto. Uma coisa é estudar, pegar em livros ou “colar” em profissionais e técnicos famosos apenas para confirmar o que se sabe ou o que se pensa saber; outra, bem diversa, é fazer a mesma empreitada tendo profunda consciência de estudante; alguém humilde e que ainda se encanta diante do conhecimento emitido por um mestre. Este é Reinaldo Rueda. Na Alemanha, todos são elogios para o ex-comandante do Atlético Nacional em virtude de sua humildade, gentileza e refino no trato com as pessoas. Quem o vê, e não o conhece bem, chega a duvidar de suas inúmeras conquistas ao longo da carreira. Mas, enfim, Rueda daria certo, se confirmado como técnico do Flamengo? Possível que sim. Vejamos, então, de quem se trata, sua visão de futebol, suas preferências e se de fato seria uma boa para o Rubro-Negro carioca.
Dispensável falar de suas conquistas, até os mais leigos se lembram de algumas. Melhor pontuarmos alguns fatores que o levaram a elas. Em 2007, seus estudos já o encaminhavam para uma carreira importante, era comandante do banco da seleção de Honduras, conduzida por ele, tempos depois, para a Copa do Mundo da África do Sul. Contudo, sua visão de futebol era voltada para a armação de equipes defensivas. Foi então que conheceu seu assistente técnico atual, Bernardo Redín. As duas mentalidades eram bem diferentes, pois Redín, embora ainda fosse um estudioso do assunto, era já um adorador do futebol ofensivo. O mais lógico era que o assistente fosse influenciado por quem o empregava, mas foi o contrário. Redín modificou a visão de Rueda, mostrando-lhe as vantagens de armar uma equipe voltada para a construção do jogo ofensivo. Rueda já era um profissional atento aos atletas, mas se impressionou com a meticulosidade com a qual Redín percebia os limites de um jogador e criava um plano para corrigi-los. Este foi outro traço do assistente que Rueda assimilou à sua prática profissional. Redín ficou ao lado de Rueda até 2014, quando foi anunciado como técnico do Monagas, da Venezuela. Porém, assim que assumiu o Atlético Nacional, Rueda chamou seu assistente de volta.
No Atlético Nacional, a impressão era a de que qualquer treinador estaria fadado ao fracasso, após a gestão impecável de Juan Carlos Osório. Rueda decidiu manter o estilo de jogo de Osório, modificando e fortalecendo a zaga, com a adoção da linha de quatro. Porém, manteve a saída da bola pela defesa, com a aproximação do volante para recebê-la e favorecer as triangulações. Além disso, treinou seus zagueiros para o lançamento da bola, que em geral era cruzado. Se Henríquez estava mais à direita, o lançamento buscava o extremo esquerdo; se na esquerda, seus lançamentos buscavam o extremo do setor direito. Em geral, o resultado era positivo, pois com a proximidade de um, e às vezes de dois volantes, à primeira linha, os defensores e principalmente volantes rivais eram surpreendidos com os lançamentos a partir da zaga. Além disso, um plano individual foi adotado para a qualificação técnica de cada jogador, principalmente aqueles que estavam no banco ou na fila para serem promovidos à equipe principal. Bernardo Redín se ocupou, por exemplo, de Berrio e seu treinamento foi vital para que o atacante flamenguista aprendesse a trocar o lado do campo, entrar em diagonal, jogar de 9 e qualificar o passe curto nas imediações ou dentro da área. Não bastasse isto e um plano de adaptação ao estilo da equipe foi adotado para os jogadores que chegassem ao Atlético Nacional. Tudo isto o Flamengo também ganhará, caso confirme Rueda.
Durante o tempo que ficou no Atlético Nacional Rueda demonstrou ser um perito em gerir plantel numeroso e qualificado. Isto ocorre, em parte, porque todos os atletas são testados quanto ao conhecimento e assimilação da proposta. Testados durante as partidas, as conversas prévias e o balanço dos erros e acertos, após os jogos. Tudo é muito claro e feito às vistas de todos, o que torna quase impossível a contestação de possíveis descontentes. Outro aspecto que faz de Rueda um bom gerente de elenco é que sua presença agrega aos jogadores uma mentalidade vencedora. Sim, muitos podem tentar o mesmo com sua fala pensada (ou não) aos seus atletas do elenco. Mas sabemos que uma coisa é o jogador olhar para um técnico esforçado e outra é olhar para um vencedor. O respeito é outro
Flamengo precisa de um técnico inteligente
Se há um debate impróprio na mídia é aquele que pauta treinador estudioso versus treinador “boleiro”. Quando pensamos neste último, possível que nos lembremos de Renato Portaluppi. Provável que aqueles que creem que ele não estuda, ou não é assessorado por vastos estudos, se enganem. Futebol moderno não admite mais um “boleiro” qualquer, principalmente em time grande. Flamengo precisa de um técnico inteligente, pois o caráter do seu elenco o exige. Quando o jogador sabe de cor o que o técnico vai dizer, ele não o escuta. E se não escuta é natural que pouco a pouco, e mesmo contra sua vontade, deixe de respeitá-lo. Todo atleta tem em sua cabeça uma ideia de jogo ou no mínimo pistas de como solucionar problemas durante uma partida. Errado ou certo, o atleta só abandonará sua visão, em prol da orientação do técnico, caso esta orientação o surpreenda. Para tanto, o discurso do comandante precisa renovar-se o tempo todo e materializar seus conhecimentos e a ampliação desses conhecimentos aos “olhos” do jogador. Caso esta não seja a situação, é até provável que os problemas não apareçam quando o time estiver ganhando. Porém, quando a equipe começar a perder a “coisa” muda de figura.
Todo ato rebelde de um jogador tende a começar na rejeição do padrão de orientação de seu comandante. Daí para formação de grupinhos é um piscar de olhos. E há situações, sabemos ou desconfiamos, em que o próprio treinador, perdido em seu papel de técnico, troca o comando da equipe pelo comando de algum grupinho formado pelos por ele ou pelos atletas. Portanto, quanto mais o elenco for qualificado tecnicamente e possuir jogadores inteligentes, mais ele necessitará de um técnico inteligente, estudioso e vencedor. Neste sentido, Rueda também se perfila como nome ideal para o Rubro-Negro.
O passador, o passe-surpresa e os recebedores
Treinadores da escola de Bielsa refletem a todo instante sobre o passe dentro de uma partida. Rueda não é um seguidor puro do “el Loco”, pois seu repertório inclui outros, como Ancelotti, Del Bosque e Osório, de quem (e às vezes indiretamente, através de Bernardo Redín),filtra os principais traços do bielsismo na sua filosófica de jogo. Pois bem, para esses treinadores, o passe é o que há de mais importante no futebol.
O passe preconiza basicamente que a bola chegue de forma segura ao seu recebedor. Dentre os dois tipos que há, é óbvio que a conexão da bola entre passador e receptor se realiza de forma tranquila no chamado passe simples. Este tem sua utilidade, mas sua importância é limitada no sentido de que serve só para quebrar a pressão do rival e para a manutenção da bola enquanto não se configura uma situação oportuna para o chamado segundo tipo de passe, o decisivo, aquele que resolve.
Especialmente durante seu tempo no Atlético Nacional, Rueda se ateve muito à reflexão sobre o caráter do passe. Inteligente que é, concluiu pela obviedade de que o passe decisivo é o mais importante e de que o passador precisa contar com uma visão periférica lapidada de forma a entender a fuga da marcação de seus companheiros próximos ou distantes. Todavia, concluiu também por algo não tão óbvio, o fato de que o melhor passe é aquele que chega aonde o receptor determina, e não o contrário. Efeito disso é que com o treinamento correto, e exaustivo, o jogo inteligente se amplia, ganhando terreno não só na mente do passador, mas também dos receptores da bola. A partir daí, e sob a supervisão de Redín, Reinaldo Rueda revolucionou os treinos no Atlético Nacional.
Técnico estrangeiro no meio da temporada
Atualmente, se o nome de um técnico estrangeiro é apontado como possível ocupante do banco de uma equipe brasileira, logo surge o argumento de que ele não teria tempo para se adaptar, já que estamos no meio da temporada. Antes de examinarmos a questão, vale lembrar que ela é resultado de outra anterior, a de que um técnico de fora não dá certo no futebol brasileiro. Engraçado como muitos ainda enchem o peito para falar “futebol brasileiro”, como se ainda fôssemos, no contexto do futebol mundial, algo além de um retrato que se desbota na parede.
Pois bem, técnico estrangeiro no meio de temporada é uma fria, mas brasileiro também é. Fatores circunstanciais parecem primar sobre sucessos ou insucessos na troca de técnico no meio de temporada. Se não for assim, Levir Culpi, Autuori e Mancini são gênios, enquanto Dorival Junior, Eduardo Baptistas e Alexandre Gallo, toscos. Apenas três exemplos que pautam as situações de Santos, Atlético-PR e Vitória, após suas trocas de treinadores: há outros. Ora, vejamos, se conhecimento e intimidade com o futebol brasileiro são vitais, por quais motivos então um técnico novo em um clube, como Dorival Junior, atualmente no São Paulo, não dava jeito no Santos? Por que Mancini não praticou na Chapecoense os “milagres” que tem praticado no Vitória? Na verdade, números mostram que com exceção de Tite, nossos técnicos “de ponta” se equivalem.
A outra questão é que técnico estrangeiro não serve para o futebol nacional. Se isto é uma verdade, ela está pela metade, pois técnico brasileiro também não serve. Tempo médio de nossos técnicos nos clubes ilustram bem a afirmação. Esta situação escancara o que se espera de um comandante do banco de reservas: que faça milagres. Não há tempo para seu trabalho ea pressão que sofre é ininterrupta embora se transvista, após as primeiras derrotas, em apoio para inglês ver. Porém, não sejamos totalmente inflexíveis frente a uma triste realidade: tempo ideal para um treinador realizar o seu trabalho e construir uma equipe vencedora, no Brasil, não existe. Sendo assim, é necessário reconhecermos que os técnicos tradicionais, e que praticam o “mesmo”, apenas perpetuam o ciclo vicioso de suas contratações e demissões, nos clubes do país.Então, um ideal mais aceitável sobe ao palco: o de que um técnico diferenciado, com ideias novas e com amplo conhecimento teórico e prático de futebol converta o tempo longo das conquistas em tempo médio. Por isso Rueda seria bem-vindo ao Flamengo. Jorginho, Carpegiani e outros nomes que se especulam são, com todo o respeito, “o mesmo”; Rueda é o diferente.
Difícil determinar o que é tempo ideal para um técnico comandar no Brasil e obter êxitos, mas 14 meses, ofertados a Zé Ricardo, parecem suficientes; pode não ser o chamado tempo longo, mas, no mínimo, é um senhor tempo médio para um técnico de ponta. Se Reinaldo Rueda se perfila como um treinador acima da média, e se a ele for ofertado um tempo parecido e até menor do que o oferecido a Zé Ricardo, ele tem tudo para triunfar no banco de reservas do Flamengo.
Esquema de jogo
Rueda é um adorador do 4-2-3-1, com dois volantes como peças vitrais da geração do jogo. Os dois laterais tendem a ser, primeiro, laterais, depois, apoiadores. Podem e devem apoiar, mas sem custos para o exercício da tarefa defensiva da equipe. Não estamos falando de laterais-zagueiros, pelo contrário até. Porém, são dos laterais que Rueda mais cobra atenção à parte defensiva. Depois destes, veem os volantes, de quem o sistema exige múltiplas funções, como a do tradicional auxílio aos laterais.
Os dois volantes precisam de mobilidade entre os zagueiros e a linha de três, mais à frente. No sistema, um deles recua para facilitar as triangulações e gerar uma saída com progressão em linha. Este jogador poderia ser Ronaldo ou Cuéllar. O campo se amplia para o passe, mas a bola vai circular numa linha horizontal até que o segundo volante a receba, se posicionando já como primeiro homem do setor criativo, ou ainda quando a bola for lançada diretamente para o meia centralizado e principal responsável pela criação das jogadas ofensivas. É vital para o sistema de Rueda que o passe saia limpo de seus volantes, pois se por um lado estes estão diretamente envolvidos na criação das jogadas, por outro, seus erros de passe podem ser o calcanhar de Aquiles do sistema defensivo.
Em situações de extrema necessidade, veremos uma transição ofensiva com 2-1-4-3, na qual dois zagueiros suportam um volante, enquanto o outro vira um meio-campista. Este jogador terá a seu lado um meia de origem e dois interinos, que são os laterais. A compactação vai saltar aos olhos, porém, uma pouco à frente veremos os dois extremos convertidos em atacantes, ao lado do camisa 9. Em tal contexto passador e receptor se confundem e a movimentação torna-se fluida e incessante, com ou sem a bola e tanto da parte dos passadores quanto dos receptores da redonda. Os ponteiros trocam de posições ou entram na área em diagonal, dificultando a marcação rival. Prioriza-se passe curto entre as linhas, contudo, por vezes, um passe final e decisivo surge justo do volante que se coloca à frente dos zagueiros. Este sistema cobrará do centroavante significativa precisão para entrar e sair da área, pivoteando e abrindo espaços para os dois pontas. Sabemos que Guerrero pode ser este jogador.
Uma linha de três sem Diego?
Provável. Há poucos técnicos tão flexíveis quanto Reinaldo Rueda, porém é a custos que ele abandona o 4-2-3-1. Com sua chegada, Berrio deverá ser o extremo pelo setor direito, pois sua associação com o lateral tecnicamente era um dos pontos fortes do campeão da Libertadores. Importa bem para o sistema que o extremo seja criativo, porém importa mais que ele tenha velocidade e até força física na execução de suas tarefas em campo. Para que o setor tenha um meia-atacante que se notabilize pela criatividade ele precisa exercê-la em altíssimo nível, de forma a compensar suas deficiências defensivas. E se este é o ponto, ele se complica ainda mais pelo fato de que pelo setor esquerdo Trauco não é um bom marcador.
Por outro lado, a linha de três exige um meia centralizado que saiba trabalhar atrás dos extremos. Este jogador há de ter uma visão periférica e precisa pensar rápido para gerar passes que quebrem as linhas defensivas e encontrem os atacantes em espaços vazios. Deste jogador o sistema exige uma alta velocidade de raciocínio e escolhas; sua mente precisa ter a velocidade física de um Orlando Berrio. No Atlético Nacional, este papel era exercido por Macnelly Torres, atleta que fisicamente nunca foi dos mais velozes. No entanto, nas situações de contragolpe ele era preciso nos passes longos no costado da zaga, em geral cruzados, e que deixavam Borja na cara do gol. Sua velocidade de raciocínio se fazia indispensável para o sucesso das jogadas. Percebemos que Everton Ribeiro pode ser um ponta-articulador dos bons, e que também pode atuar pelo setor esquerdo. Porém, dada à sua condição de principal passador da equipe, é bem provável que Rueda o utilize centralizado, no lugar ocupado hoje por Diego.
Alternativa seria modificar o sistema para um 4-1-4-1. Mas se há uma grande vantagem em um elenco qualificado é que ele oferece opções para o técnico praticar o esquema que mais lhe convém. Diego poderia ser recuado para segundo volante. E pode. Mas, como vimos acima, é exigido dos volantes um altíssimo comprometimento também com a marcação. Desta forma, tudo indica que Diego possa ir para o banco de reservas.
Se confirmado Rueda...
Chegada de Rueda pode significar uma mudança real de patamar no Flamengo. O clube da Gávea teria no seu banco de reservas um dos mais inteligentes e vencedores técnicos das Américas. Teria uma equipe que joga da mesma forma dentro e fora de campo, o que contribui para assegurar a identidade futebolística da equipe e nutrir seu DNA de personalidade. Além disso, o clube poderia ser estimulado a investir pesado nas suas estruturas e no treinamento sofisticado de seus atletas, até mesmo os das categorias de base. Os assistentes de Rueda são todos eles profissionais sofisticados. Dentre eles, está Eduardo Velascos, tido como o melhor preparador de goleiros da Colômbia, e profissional com vários convites recusados para trabalhar no futebol europeu. Então, se for o caso de Reinaldo Rueda ser confirmado como o novo técnico,que ele tenha sorte, assim como o Flamengo em seu caminho. Caminho que de fato se anunciaria como novo, diferenciado e promissor.
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terça-feira, 31 de janeiro de 2017
O que esperar de Orlando Berrío, por Joza Novalis
Depois de Trauco, Rômulo e Conca, o Flamengo apresenta nesta tarde o seu mais novo reforço: Orlando Berrío.
Pelo Atlético Nacional, o colombiano fez 49 jogos, com 97 finalizações, 15 gols, 15 assistências e 35 desarmes. Na Taça Libertadores, Berrío contribuiu com quatro gols, 16 assistências para finalizações e 11 finalizações certas, sempre jogando pela direita.
Mas são apenas números. Quem sabe mesmo do assunto é o nosso colaborador e amigo Joza Novalis, que concedeu uma ótima entrevista sobre a Libertadores e o Flamengo.
Agora Novalis volta com uma análise completa de Orlando Berrío. Confira:
"Orlando Berrío chega ao Flamengo como um dos melhores reforços possíveis com vistas a grandes conquistas. Muitos torcedores estão contentes, mas alguns parecem contestar a contratação. Mal sabem das tentativas da direção; da lista e dos diversos nomes que estavam nela. Alguns, tanto de brasileiros quanto de sul-americanos, sequer foram cogitados pelos especuladores de plantão.
Anunciado Berrío, alguns perguntavam por que não foi Eduardo Vargas, aquele que exceto em La U, e no começo da carreira, nunca “jogou bola” em clube qualquer, mas apenas na seleção chilena. Vitinho, Marinho, tantos outros, enfim... Alguns chegaram a comparar Berrío com Cirino. Correto em parte, no físico. E qual o problema da comparação? Ela é livre, todavia os polos que a constituem não se integram. Então, nossa descrição de Berrío vai falar de um jogo grande no qual ele foi decisivo. Deixemos Cirino em paz, com sua atitude de cavar esconderijos em campo. Falemos do reforço, do que ele pode acrescentar e da melhor forma como Zé Ricardo poderá utilizá-lo. Paciência será necessária para que conheçamos Berrio na perspectiva de sua participação no grande jogo de sua vida.
Foi no último suspiro futebolístico do jogo que tudo aconteceu: no último suspiro de Orlando Berrio que o Atlético Nacional conseguiu edificar o seu caminho para o caneco da Libertadores em 2016.
“Es um negro de mierda, tengalo claro!”
A frase era de Sebastián Sosa, o guardametas uruguaio a serviço do Rosário Central naquela que foi a decisão antecipada da Libertadores. De um lado a melhor campanha indiscutível da fase de grupos; do outro, a equipe que apresentava o melhor futebol: no palco, protagonistas diversos a ponto de se tornarem anti-heróis: junto a eles, um coadjuvante com forte potencial para salvar o futebol: Berrio. Contudo, sempre que chegava à área ouvia a frase: “no lo va a conseguir pues que es solo um negro de mierda”. Voltemos um pouco.
O Atlético Nacional não tinha Borja, mas o elenco era até melhor do que o dos dias atuais. A dupla de volantes era formada por Sebastián Pérez e Alexander Mejía, talvez o melhor camisa 5 atuando nas Américas; por certo aquele que tem o melhor passe longo. Na criação, gente do calibre de “Lobo” Guerra e Macnelly Torres; nas laterais, Bocanegra e Farid Díaz. Henríquez capitaneava o esquadrão; Marlos Moreno era o nome da vez e Copete recebia prestígio para ocupar a vaga do lesionado Víctor Ibarbo, exemplo de repatriação bem-sucedida. Contudo, nas palestras de “Chacho” Coudet, a recomendação era para que todos os cuidados recaíssem em dois jogadores, no reserva Andrés Ibargüen e principalmente em Orlando Berrío.
Essas recomendações provavelmente foram reafirmadas nos vestiários, no intervalo, pois tudo saía como desejava o técnico do Central. Sua equipe vencera na ida por 1x0. Através de pênalti contestável, saiu na frente, no Girardot, e mesmo com o empate no intervalo, a situação era a melhor possível. A equipe local precisava de dois gols. E ela teria dificuldades para fazê-los não apenas porque seus esforços foram previstos e parte de suas soluções futebolísticas bloqueadas, mas também porque esse jogo foi a história de uma traição: a do técnico Coudet às suas convicções futebolísticas.
O time mais encantador da fase de grupos praticamente cedeu todo o campo para o Verdolaga e passou a defender sua meta com 11 jogadores. O que se via na cancha do Verde era uma equipe que representava a dignidade do futebol contra outra que ao adotar o jogo do medo, excessivamente defensivista, se comportava como time pequeno. E como não era um time pequeno o futebol que praticava não era legítimo.
“Na hora do desespero, o drible longo do Marlos não funcionará; Macnelly baterá cabeça com Mejía; Guerra com Copete e Marlos; com duas linhas compactas bloquearemos a confusão ofensiva do rival. Mas é preciso tomar cuidado com o drible curto do Ibargüen e com a força física e com a polivalência do Berrío. Ele será centroavante, será ponta, será até o lateral no lugar do Bocanegra. Ele não vai desistir nunca, precisa ser anulado”. Coudet sabia do que falava. Seus assistentes receberam diversos relatórios sobre os jogadores do rival e se espantaram com as descrições feitas de Berrio. E quem era esse jogador? Para Sosa, “um negro de mierda”. Sua frase era cruel, mas ela tinha um objetivo: destruir no jogador aquilo que ele possuía de melhor: seu equilíbrio.
Orlando Enrique Berrío Meléndez sempre foi um garoto gigante de corpo, mas muito educado também. Há um verso de um poeta francês, Rimbaud, que remete à ideia de que o excesso de educação pode estar ligado à incapacidade de alguns em responder à altura frente a certas situações. Possível que este problema tenha afetado o garoto que com 18 anos incompletos foi alçado ao profissionalismo e, de cara, ao time titular. Na base, ele fora tido como uma das maiores revelações do futebol colombiano. Tudo o que fazia dava certo; sempre assumia o protagonismo e raramente não levava sua equipe ao triunfo. Era em quem todos os garotos assustados ou perdidos confiavam nos momentos mais difíceis.
Contudo, o Atlético Nacional estava longe de ser a máquina institucional de hoje em dia. Vivia este processo, mas ele era incipiente. De forma que as expectativas foram tão grandes que jogaram um enorme peso nas costas do garoto: todos podiam errar, exceto ele. Não importavam seus esforços, pois bastava à equipe atuar mal, e perder uma partida, para que o culpado fosse ele, Berrio. O garoto fugia de entrevistas, mas nunca reagia às críticas e às ofensas; preferia se calar em virtude de sua educação. Tentou resolver em campo, mas seus arranques eram bloqueados; seus dribles quebrados, seu pivô na frente da área era antecedido pelo passe curto sempre errado. As coisas não funcionavam para quem outrora fora a brilhante promessa das “canteras” colombianas. O Nacional resolveu emprestá-lo justo para o Millonarios, clube que vivia (e ainda vive) uma profunda crise de identidade. Berrio foi hostilizado desde o início pela torcida e colocado no banco pelo técnico. Quando raramente entrava em campo, o uníssimo das vaias acobertava suas tentativas de reação. Ficou pouco no Millos e foi emprestado para o Patriotas FC. História se repetiu: ouvia coisas da torcida local: xingos, ofensas e a crueldade de alguns, especialmente da tribuna de honra do estádio, de associar seu difícil momento futebolístico à cor de sua pele. Até então, suas respostas se convertiam em explosões repentinas que o levavam a grandes faltas e suspensões.
Posteriormente ao choro, arrependimento e a inúmeros pedidos de desculpas. Eis que chegou o dia em que justo num jogo contra o Millonarios o garoto encontrou a fórmula para espantar seus anos de frustração como profissional. As duas torcidas o vaiavam quando foi pegar a redonda para cobrar um lateral. Conta-se que ele parou, fixou os torcedores e percebeu que todos falavam as mesmas coisas. A força daquilo não era tão relevante assim, pois não passava da fala de um ou outro, papagaiada pela multidão. Alguma coisa aconteceu, pois passou a selecionar as críticas que levava em consideração; além disso, passou a simplificar seu jogo. No lugar de tentar fazer tudo pelo time, passou a fazer todo o possível em poucas jogadas. O garoto da base começava a se reconectar com o agora jogador profissional.
Lembrando que após sofrer o gol bem no início da partida, o técnico Rueda tira Berrio do banco, onde estava por uma moléstia física. Entra em campo com 34 minutos de bola rolando. Após intensa pressão, já nos acréscimos do primeiro tempo, Berrio, que segundos antes estava no círculo central, pega a pelota de frente para uma área congestiona, faz jogada estupenda, livra-se de três jogadores e a entrega para Macnelly Torres guardar: era o empate do Verde.
De onde vinha aquela capacidade de recomposição? De circular por vários setores do campo, se colocando em lugar de volantes, laterais, centroavante e mesmo assim nunca deixar de ser o mais eficiente extremo do futebol colombiano? Recém-chegado a Medellín, Juan Carlos Osório exigiu que seu novo clube resgatasse ao Patriotas um dos grandes destaques do campeonato. Assim que o incorporou, o ex-treinador do São Paulo tratou de situar o jogador na melhor posição possível para que seu futebol deslanchasse de vez. Osório percebeu que ele poderia ser um nove (como vinha jogando), um volante interior e mesmo um lateral-ala. Contudo se deu conta de que se Berrio fosse posicionado como extremo ele faria tudo isto muito bem e sem deixar de ser o ponta agudo que levou o Flamengo a contratá-lo.
Características do jogador
Aos poucos, Osório notou que a polivalência de Orlando Berrío era ainda maior do que supunha. Então, resolveu fazer duas coisas. A primeira delas foi contratar um psicólogo para contornar as explosões do jogador que ainda ocorriam dentro de campo. O “es um negro de mierda”, pronunciado por Sosa, era resultado do estudo e conhecimento do perfil do extremo flamenguista e da certeza de que a explosão voltaria a aparecer dentro do grande jogo. Fora a leitura do que Sosa fizera das recomendações dadas a ele e ao elenco do Rosário Central pelo técnico Coudet. Berrío foi o primeiro a passar por um profissional, mas hoje em dia o clube tem uma equipe composta por 16 psicólogos que presta o mesmo serviço a todos os jogadores do elenco. A segunda atitude de Osório consistiu em explorar todos os recursos do jogador e lapidá-los. No fim das contas, o atacante que o Rubro-Negro contrata consegue:
- atuar como volante, ocupando a faixa central do campo e a partir daí recuar ou avançar conforme a necessidade da equipe. Preferencialmente como volante interior;
- ser um típico “carrillero”, conceito bastante abrangente, mas que essencialmente abarca aquele jogador que ocupa o lado do campo, percorrendo-o de um ponto ou outro: conceito mais amplo do que os de lateral e ala, pois sintetiza a ambos;
- ser um driblador. O fato de possuir um drible longo está associado à força física de Berrío e à sua velocidade. Mas embora não seja um Ibargüen (longe disso), também consegue praticar o drible curto e desconcertante que tanto suas equipes precisaram em momentos decisivos. Parte disso vem da abertura dos braços, o que expande o corpo, projetando-o como um arco que amplia o espaço da bola sob o seu domínio, dificultando sua retomada pelos marcadores: o lance do gol de empate contra o Rosário Central é um exemplo;
- ser um marcador tanto no campo de ataque quanto no de defesa. Para aqueles que comparam o novo reforço com Cirino é bom lembrar que este até oferece combate defensivo na frente, mas é insignificante quando se trata de acompanhar o atacante rival até o campo de defesa. Nisto, Berrío é superior a Cirino e a qualquer outro atacante e meio-campista do atual elenco rubro-negro;
- ser improvisado como camisa 9. Começou assim na carreira e foi colocado como extremo por Osório perceber que centralizá-lo no meio dos zagueiros era reduzir o potencial futebolístico do atleta. Contudo, nada impede a Zé Ricardo de improvisá-lo de 9, em algumas circunstâncias;
- ser eficiente no jogo aéreo. Porém, só em parte. Se há uma deficiência a corrigir é a de se apresentar e fazer poucos gols de cabeça. Curiosamente, na parte defensiva, era um dos jogadores que mais cortava cruzamentos no Patriotas FC. No Nacional nem tanto, pois os zagueiros foram trabalhados na base para executar quase à perfeição este fundamento;
- ser polivalente e obediente às recomendações de seus treinadores. E neste sentido, o que mais se destaca é sua capacidade de atuar pelos dois lados do campo. O fato de Berrio pouco ser flagrado pelo lado esquerdo debita-se à proposta de jogo do Atlético Nacional de jogar com dois extremos e de sempre dispor de um deles para ocupar o setor esquerdo. Ocorre que para confundir a marcação, tanto com Osório quanto com Reinaldo Rueda, a equipe verdolaga invertia os seus extremos. Nem tanto por dificuldades, mas por birra, Jonathan Copete perdeu a titularidade, pois se recusava a trocar de lado. Esta teimosia não faz parte do comportamento de Berrio. Para o auxiliar técnico, Bernardo Redín, o novo reforço do Flamengo era o mais polivalente da equipe (a nosso ver, empatava com Guerra) e o melhor quanto a ouvir e a cumprir fielmente as recomendações do treinador. Ainda para o principal auxiliar de Reinaldo Rueda, o jogador sempre foi o primeiro a reconhecer seus erros em campo e a pedir desculpas aos seus companheiros, nos vestiários;
- executar a cobertura e apoio aos laterais. A nosso ver, esta é a principal deficiência do atual Flamengo. Em geral, esta função é cumprida por Marcio Araújo. Isto ocorre justo porque os atacantes de lado executam mal a recomposição. Colocar Berrío como extremo esquerdo, assim como inverter os dois ponteiros, é algo que Zé Ricardo pode explorar com a chegada do novo reforço. Vantagem, no caso, ao menos quanto a Berrio, é que a qualidade do seu futebol se mantém a mesma, quando ele atua pela esquerda;
- ser o homem do passe final. O que ocorreu no lance do gol de empate, contra o Central, e no gol decisivo de Borja, no jogo de volta contra o São Paulo, no qual Berrío teve uma atuação estupenda;
- ser peça-chave para o contragolpe. Esta é mais uma razão pela qual chega a ser uma heresia comparar Berrío com Cirino. Em situações de pressão, encontramos o colombiano quantificando a primeira linha ou como volante; ou seja, nos lugares perfeitos para o contra-ataque. Lugares em que nem sempre a torcida flagra o pouco interessado Marcelo Cirino.
Final do grande jogo
Jogo segue com pincelas de uma batalha épica no Atanásio Girardot. Aos cinco minutos da segunda etapa, após brilhante jogada coletiva, a equipe verdolaga vira o marcador. Era a primeira vez, após 140 minutos de confronto, que os colombianos se colocavam à frente do Rosário Central. Então, se estabelece de vez o aluga-se meio-campo. No entanto, para a surpresa de todos, e à medida que o tempo passa, o antijogo do Central se alimenta do desespero do Atlético Nacional e parece ladrilhar o caminho do triunfo argentino. O jogo de pressão segue seu curso, mas pouco a pouco a articulação das ideias se esvai e deixa de alimentá-lo. A equipe local já tem quatro atacantes na cancha. Aos 36’, Bocanegra cruza para a área, Berrío voa sobre a bola e acerta o cabeceio para a defesa de Sosa. Já aos 40’, ambos se chocam na área e o arqueiro fica no chão por mais de um minuto, sugerindo dores que não existiam: nada fora dito nesses momentos, mas o efeito das falas anteriores seguia no olhar de um deles e na alma do outro: “no lo va a conseguir pues que es solo um negro de mierda”. Sebastián Pérez, Macnelly e Copete já não estão em campo. Nos minutos finais, Henríquez e sobretudo Marlos Moreno se agigantam na mesma dimensão da frustração que vai danificando a magia de seu futebol. Alejandro Guerra está perdido e Alex Mejía não acha o ângulo certo para ofertar o passe consagrador.
Qual o limite para ofensas e agressões que acontecem dentro de campo? Dentro dele, uma resposta “a Grafite”, por parte do ofendido, pode ser justificada, mas em termos futebolísticos é a melhor? Quem somos nós para sabê-lo? Para Sosa, tudo o que aconteceu “são coisas do jogo, e que devem ser sepultadas dentro de campo”. Sua intenção certamente era a de quebrar o equilíbrio daquele que seu treinador apontara como um dos únicos capazes de se manter taticamente focado até o fim. De certo que quem alude à “raça” de alguém, em termos provocativos, não entende que sua fala passeia pela alma da vítima resgatando momentos semelhantes ao longo de toda a sua vida. E quem consegue manter sua altivez em tais circunstâncias, ater-se a questões táticas e fazer de conta que nada disso faz sentido em tais momentos? Fato é que aos 49’ de jogo, as lágrimas tomavam conta do Atanásio Girardot. Crianças, idosos, homens e mulheres: era o sonho se colorindo do desespero. Quase todos andavam em campo para lá e para cá sem guardar posição. Exceto um: aquele que precisava ser o centroavante. Após ensaiar soluções infrutíferas, Ibargüen consegue a jogada ideal e lança a bola para a área. Henríquez escora de cabeça e Orlando Berrío enterra a pelota no arco do seu torturador. Antes de partir para o abraço, grita o gol na cara de Sosa. Não era o grito de sua liberdade ou de sua consagração: isto tudo já estava com ele. Era o grito de sua verdade: mesmo testado aos extremos, seu equilíbrio se mantivera até o fim porque ele Orlando Berrío, era diferente.
Este é o jogador que o Flamengo acaba de contratar".
sábado, 7 de janeiro de 2017
Libertadores 2017: entrevista com Joza Novalis
O blog entrevistou o jornalista Joza Novalis, um dos mais entendidos do futebol sul-americano.
O assunto? Claro: Copa Libertadores da América.
Confira:
O Flamengo tem tido vexames na Libertadores. Nas duas últimas edições foi eliminado na fase de grupo. Pelo elenco que tem, pelos nomes que ainda vão chegar, acredita que finalmente o clube entre pra ganhar?
Veja, um dos problemas de nossos dirigentes e comissões técnicas, e que afeta também a jornalistas e por extensão também aos torcedores, é o pouco conhecimento do rival. Mais que isso, a falta de dimensionamento sobre ele. Nisto, somos imberbes perto dos sul-americanos em geral. Eles olham para nós preocupados, nos estudam e nos dimensionam no real tamanho e capacidade que possuímos. Em seguida, canalizam esses esforços para as partidas contra nós. Então, afirmo de cara, o Flamengo pode não apenas passar de fase, mas avançar muito no torneio e chegar às suas fases decisivas. Porém, tudo isso em tese; para tanto, terá de fazer suas lições. E creiam-me, elas não são poucas. A primeira delas é entender que as coisas não dependem só do Flamengo, mas também dos rivais: eles existem e, no caso, são muito bons. Prova, portanto, de como as coisas são difíceis está no fato de que se o Rubro-Negro fizer tudo corretamente ainda terá de passar por rivais duríssimos e que também podem fazer não apenas as coisas certas, mas ainda em nível mais profundo do que o gigante carioca.
A diretoria do Flamengo nunca tratou a Libertadores como deveria, sempre considerou uma competição igual ao Estadual. Qual o segredo pra disputar e ser vitorioso nessa competição?
Esta observação ganha relevo, se olharmos para a campanha na Sul-Americana de 2016. A oportunidade era ímpar para o início de um processo de internacionalização. E para um clube como o Flamengo isto importa muito à medida que atrai muitos recursos, à medida que a equipe chega às instâncias finais. Atrai patrocínios e recursos que veem sobretudo da reconexão de muitos torcedores com a alma vencedora do Rubro-Negro. Aliás, dirigentes, não só do Flamengo, abordam muito o assunto, mas parecem ter dificuldades para entende-lo em sua profundidade. Vejo a participação na Sul-Americana como um fiasco que só não foi maior do que as ideias e posturas que o materializaram. O confronto contra o Figueirense escancarou erros que pediam atenção. Eles foram ignorados. Efeito disso foi a eliminação vexatória para o humilde Palestino. Na ocasião, torcedores me pediram, no twitter, que fizesse observações sobre o time chileno. Poucos levaram a sério quando eu disse que embora favorito, o Fla deveria ter uma atenção especial para o rival. Concordaram com o favoritismo, mas fizeram chacota sobre a necessidade da atenção ao desconhecido rival. Ora, o comportamento desses torcedores vinha de fatores culturais (somos sempre os melhores do mundo no futebol), mas também da leitura do que se passava na cabeça da comissão técnica. Então, após a contestável vitória no Chile, enquanto o técnico Nícolas Córdoba passou para seu elenco mais de 70 horas de vídeos sobre o Flamengo, além de estudos completos sobre cada um de seus jogadores, por aqui quase nenhuma pessoa considerou que o representante brasileiro já não estava nas quartas de final. Então, a postura correta, nessas competições, pode ser uma arma mais eficiente do que os grandes elencos. Dirigentes de clubes brasileiros pensam no elenco. A direção do Flamengo se comportou assim, da mesma forma que sua comissão técnica. Portanto, este é o primeiro erro que não deve ser cometido, quanto à pretensão de ser vitorioso na competição. A Católica deve selecionar dois observadores para acompanhar o seu rival brasileiro na Taça Guanabara; um deles é uruguaio e muito profissional. Claro que podemos pensar que o Fla poderá esconder o jogo, no Regional, atuando com reservas, time mesclado e tal. Mas esses observadores, antes de virem para ver jogadores, virão para entender a filosofia de jogo do treinador da equipe, além de fatores como ação e reação numa partida, comportamento da equipe frente ao apoio ou crítica da torcida durante um jogo e assim por diante. O Flamengo não precisa copiar o método da Católica, que, aliás, não será adotado nem pelo San Lorenzo. Porém, precisa fazer algo em torno de olhar para o rival, entender suas grandezas e limitações e saber armar-se corretamente para derrota-lo. Ou seja, para vencer na competição, o extracampo é tão fundamental quanto a um elenco de grande qualidade.
Sobre Donatti, Cuellar e Mancuello. Eram titulares absolutos em seus antigos times, porém agora enfrentam dificuldades de se encontrarem no Flamengo. São jogadores com cara de Libertadores? Qual explicação e o que acha deles?
Donatti talvez o grande jogador do Rosário Central, na Libertadores passada. Muitos falavam que Pinola era um zagueiro melhor. Mas “el Pelado” Pinola vinha mal na carreira e só voltou a ganhar nível ao lado de Donatti. Sua capacidade de orientação e de posicionamento e reposicionamento de seus colegas de defesa é rara. Por isso, foi o grande zagueiro do campeonato argentino anterior e um dos melhores da equipe, na Libertadores. Sua capacidade de orientar é fruto também da confiança que seus colegas depositam nele. E tal confiança só existe porque Donatti compra em campo a briga por qualquer jogador. Exemplo: na estreia contra o Nacional, no Gigante de Arroyto, quase todos saíram com a impressão de que Donatti falhara em lances capitais. Contudo, na ocasião, um garoto muito bom, e que não vinha da base do clube, estreava na equipe e não podia falhar diante de 41 mil torcedores. Se alguém puder ver um tape daquele jogo, verá que todas as supostas falhas de Donatti, na prática não foram dele, mas de Gastón Gil Romero. Donatti encobriu todas essas falhas posicionando-se nos lugares certos para que, aos olhos dos outros, ele fosse o vilão. E foi o que aconteceu. Esta é uma grande qualidade deste jogador. Alguns o acusam de lento, mas ele sabe se posicionar e posicionar os seus companheiros nos espaços certos do campo. E algo que poucos se recordam é que o Central atuava lá no campo de ataque, deixando sua defesa exposta. Portanto, ele tem sim a cara de Libertadores. Mancuello, Idem. Cuéllar também possui tal característica, mas bem atrás de seus dois companheiros de equipe. Dos três, Cuéllar é o melhor pelo caráter de sua polivalência. Ou seja, se posicionado em outros setores do campo, não tende a diminuir o tamanho de seu futebol. Claro, muitos irão discordar. Porém, a análise sobre o jogador precisa considerar suas passagens anteriores, pelo Cali e Junior de Barranquilla. Quanto à adaptação isto é bem complicado. Mas asseguro que passa também pela confiança que o jogador sente depositada nele pela comissão técnica. Recém-chegado ao clube e ainda desacreditado, Rafael Vaz teve uma falha grotesca, contra o Fluminense. Zé Ricardo foi mestre em não abandonar o jogador no banco de reservas. E o resultado sabemos qual foi, o zagueiro se tornou um dos melhores da equipe. Já Donatti teve uma infelicidade contra o Figueirense. Porém, o tratamento que recebeu não foi o mesmo. Cuéllar iniciou bem sua participação na equipe ainda dirigida por Muricy. Lembremos: poucas coisas funcionavam naquela equipe. Com Zé Ricardo a equipe pratica um tipo de jogo em que muitas vezes meio-campo e laterais atacam ao mesmo tempo. Defesa fica exposta num corredor aberto pelo centro ou pelos flancos. Então, Marcio Araújo é colocado à frente da defesa. Na prática ele atua como um zagueiro à frente da linha defensiva. Corta bola aqui, corta bola lá, mas apresenta dificuldades extremas de dar um passe de cinco metros. Tudo bem, é a escolha do técnico e eu o respeito pelo seu trabalho no comando da equipe. Porém, se colocasse um zagueiro de verdade na posição não seria melhor? Vem menos ao caso; importa mais é que o técnico e parte da torcida esperam de Cuéllar a mesma coisa. E como ele não faz desse jeito, não serve. Pior que isso é o fato de que Cuéllar não faz da mesma forma que Marcio Araújo porque “não é um primeiro volante”. E o que começa como uma percepção ingênua vira uma verdade. Ora, Cuéllar era um excepcional primeiro volante no Junior de Barraquilla. Por vezes, era segundo também. Sabia marcar, oferecia armação qualificada antes e dentro do grande círculo e muitas vezes chegava à frente para concluir. O fato é que é moderno demais para a posição e Zé Ricardo não quer nada disso. Resultado, também Cuéllar foi para o banco. Portanto, é também por isso que Donatti e Cuéllar encontram dificuldades no clube e estão longe de conseguir uma adaptação satisfatória. Embora eu creia que Mancuello possa entrar mais na equipe, o caso dele é diverso: tem forte concorrência e teve, dentre os três, maiores oportunidades.
Qual sua opinião sobre o trabalho do Zé Ricardo e sua pouca experiência pra disputar logo de cara uma Libertadores. Gosta dele?
Experiência em si pode ajudar, mas não é decisivo. Zé Ricardo representou a melhor decisão possível em termos de substituir Muricy. A direção não concordaria, mas Zé Ricardo mostrou também o quanto Muricy fora uma péssima escolha. Indiscutível que Zé Ricardo encontrou um padrão para a equipe e a fez jogar. Mas a meu ver, o esquema se modificava pouco e se revelou passível de ser encaixado pelas equipes rivais, ao fim da temporada. Um dos aspectos do esquema, previa que o extremo desse combate no lateral ainda no último terço do campo. Desta forma, tanto Jorge quanto Pará/Rodnei deveriam se deparar com o atacante no máximo no um a um, bloqueando a profundidade do jogo rival e obrigando-o a explorar o povoado centro à frente da grande área. Quando a bola então caia neste setor, quem era o primeiro homem a dar o combate? Marcio Araújo. Se o esquema funcionasse bem, este jogador poderia ser Cuéllar, por exemplo. A vantagem, no caso, é que quando o colombiano pegasse a bola, a boa armação da equipe começaria dali, e com qualidade. Porém, o que começou com uma entrega total foi se perdendo com o passar dos jogos. Os extremos apresentavam dificuldades para dar o bote, o que obrigava o lateral a atuar quase como um volante, combatendo ou tentando combater o atacante, que fugia fácil da marcação de extremos como Cirino. Então, mesmo que Jorge se consagrasse, mostrando até um potencial para atuar como volante, o seu cacoete para tal não era dos melhores. Mas se no caso dele as coisas não se complicavam tanto o mesmo não ocorria pelo setor direito da defesa. O fato é que nos dois casos a bola muitas vezes passava solta para o campo de defesa do Flamengo. Quando isto acontecia, a defesa exposta ganhava o reforço de um esforçado zagueiro de corte e que atuava à frente de Réver e Vaz: Marcio Araújo. Ele corria de um lado a outro e muitas vezes fazia o corte. Os olhares que aprovaram a temporada do volante não se deram conta de que talvez um outro alguém com ótima preparação física poderia fazer o mesmo. Se o esquema funcionasse corretamente, Marcio Araújo era desnecessário, e se ele era uma peça necessária num esquema que estava doente, o correto era aplicar a tal esquema uma cura. Nesta hora, o treinador precisa aparecer. E Zé Ricardo não apareceu. E por não aparecer, mostrou limitações que precisam ser consideradas.
Zé Ricardo tem alguns traços dos grandes treinadores. Tem personalidade, pulso firme e banca seu trabalho mesmo diante de possíveis pressões. Digo possíveis pois sei que da direção do clube não parte outra coisa que não seja apoio. Ele tem o comando da equipe e não permite que nenhuma voz descontente ganhe relevo. No entanto, um grande técnico há de ser também um grande gestor de elenco. Não basta tirar um jogador do time e colocá-lo no banco de reservas. Ao fazer isso, o técnico precisa cuidar para que o jogador não vá para o banco inseguro e infeliz. Se isto acontecer, esse jogador poderá se perder completamente. A partir do banco ele dificilmente vai reconstruir sua segurança e autoestima. Quando tiver uma oportunidade, dificilmente atuará bem, pois será presa fácil da pressão das circunstâncias, da necessidade de provar algo para o técnico ou torcida não em quatro ou cinco jogos, mas em 90 minutos etc. Nenhum jogador é santo ou não mereça uma parcela pela queda de seu rendimento, mas também cabe ao técnico uma parcela considerável de tal responsabilidade. E isto fica ainda pior para o técnico, se tal ou tais jogadores apresentavam históricos positivos em seus clubes anteriores, casos principalmente de Cuéllar e Alejandro Donatti. Contudo, acredito que Zé Ricardo possa comandar o Flamengo na Libertadores, desde que faça as necessárias adequações ou readequações na equipe, quando necessário e quando ele, por sua inteligência, perceber o quanto elas serão vitais para que o Rubro-Negro não caia no encaixe da marcação de seus rivais.
O campeonato argentino está em andamento, o San Lorenzo vai estrear na Libertadores já com ritmo de campeonato, mas o cansaço de final de temporada para eles pode pesar. Acha positivo ou negativo?
A questão passa muito pelo caráter do trabalho físico no Ciclón. Poucos sabem, mas o San Lorenzo tem um elenco vastíssimo. Alguns jogadores atuavam pouco. Nesses dias, a mídia tem noticiado as saídas de nomes importantes, como Mas, Blanco, Cauteruccio e outros. Creio que será positivo, pois bons jogadores que já estavam no clube serão forno para o amadurecimento de jovens da base que pedem passagem.
Com a Libertadores durante o ano inteiro, vai criar paralelo com o Brasileiro. Na sua opinião, por acontecer de forma inédita, como os clubes brasileiros deverão trabalhar para disputar fortemente as duas competições?
Sem desespero, com calma, planejamento adequado e, mais que nunca, com a ideia de que bons jogadores são importantes dentro de campo, mas também como forno para os jovens da base. Os elencos precisam se ampliar. Mas grande número de contratações onera os cofres dos clubes.
Assim que o grupo da Libertadores foi divulgado, muitos argentinos temeram o Flamengo, por ter entrado no grupo do San Lorenzo. Mesmo após anos de fracasso na Libertadores o Rubro Negro segue respeitado por sua força. Mas como traduzir isso dentro de campo? O adversário trata mesmo o confronto contra o Flamengo como uma verdadeira final?
Sem dúvida. O tempo inteiro aqui estou falando a partir da perspectiva do Flamengo, daí que só falo das outras equipes. Na perspectiva deles, porém, o Rubro-Negro de fato é assustador. Mas na sua pergunta já há uma resposta. Eles tratam seus jogos contra o Flamengo como uma final, basta ao Rubro-Negro fazer o mesmo. Mas não da boca para fora. Se vão estudar o Flamengo de forma profunda, a esquadra carioca há de fazer o mesmo. No caso do San Lorenzo e Católica há uma conexão significativa das equipes com suas massas torcedoras. Principalmente no caso argentino, os torcedores apoiarão sua equipe mesmo se ela estiver perdendo de goleada. No dia em que um clube brasileiro fizer o mesmo, ou seja criar tal conexão, mesmo em situações adversas, será ainda mais temido dentro de campo pelos rivais da América do Sul.
O assunto? Claro: Copa Libertadores da América.
Confira:
O Flamengo tem tido vexames na Libertadores. Nas duas últimas edições foi eliminado na fase de grupo. Pelo elenco que tem, pelos nomes que ainda vão chegar, acredita que finalmente o clube entre pra ganhar?
Veja, um dos problemas de nossos dirigentes e comissões técnicas, e que afeta também a jornalistas e por extensão também aos torcedores, é o pouco conhecimento do rival. Mais que isso, a falta de dimensionamento sobre ele. Nisto, somos imberbes perto dos sul-americanos em geral. Eles olham para nós preocupados, nos estudam e nos dimensionam no real tamanho e capacidade que possuímos. Em seguida, canalizam esses esforços para as partidas contra nós. Então, afirmo de cara, o Flamengo pode não apenas passar de fase, mas avançar muito no torneio e chegar às suas fases decisivas. Porém, tudo isso em tese; para tanto, terá de fazer suas lições. E creiam-me, elas não são poucas. A primeira delas é entender que as coisas não dependem só do Flamengo, mas também dos rivais: eles existem e, no caso, são muito bons. Prova, portanto, de como as coisas são difíceis está no fato de que se o Rubro-Negro fizer tudo corretamente ainda terá de passar por rivais duríssimos e que também podem fazer não apenas as coisas certas, mas ainda em nível mais profundo do que o gigante carioca.
A diretoria do Flamengo nunca tratou a Libertadores como deveria, sempre considerou uma competição igual ao Estadual. Qual o segredo pra disputar e ser vitorioso nessa competição?
Esta observação ganha relevo, se olharmos para a campanha na Sul-Americana de 2016. A oportunidade era ímpar para o início de um processo de internacionalização. E para um clube como o Flamengo isto importa muito à medida que atrai muitos recursos, à medida que a equipe chega às instâncias finais. Atrai patrocínios e recursos que veem sobretudo da reconexão de muitos torcedores com a alma vencedora do Rubro-Negro. Aliás, dirigentes, não só do Flamengo, abordam muito o assunto, mas parecem ter dificuldades para entende-lo em sua profundidade. Vejo a participação na Sul-Americana como um fiasco que só não foi maior do que as ideias e posturas que o materializaram. O confronto contra o Figueirense escancarou erros que pediam atenção. Eles foram ignorados. Efeito disso foi a eliminação vexatória para o humilde Palestino. Na ocasião, torcedores me pediram, no twitter, que fizesse observações sobre o time chileno. Poucos levaram a sério quando eu disse que embora favorito, o Fla deveria ter uma atenção especial para o rival. Concordaram com o favoritismo, mas fizeram chacota sobre a necessidade da atenção ao desconhecido rival. Ora, o comportamento desses torcedores vinha de fatores culturais (somos sempre os melhores do mundo no futebol), mas também da leitura do que se passava na cabeça da comissão técnica. Então, após a contestável vitória no Chile, enquanto o técnico Nícolas Córdoba passou para seu elenco mais de 70 horas de vídeos sobre o Flamengo, além de estudos completos sobre cada um de seus jogadores, por aqui quase nenhuma pessoa considerou que o representante brasileiro já não estava nas quartas de final. Então, a postura correta, nessas competições, pode ser uma arma mais eficiente do que os grandes elencos. Dirigentes de clubes brasileiros pensam no elenco. A direção do Flamengo se comportou assim, da mesma forma que sua comissão técnica. Portanto, este é o primeiro erro que não deve ser cometido, quanto à pretensão de ser vitorioso na competição. A Católica deve selecionar dois observadores para acompanhar o seu rival brasileiro na Taça Guanabara; um deles é uruguaio e muito profissional. Claro que podemos pensar que o Fla poderá esconder o jogo, no Regional, atuando com reservas, time mesclado e tal. Mas esses observadores, antes de virem para ver jogadores, virão para entender a filosofia de jogo do treinador da equipe, além de fatores como ação e reação numa partida, comportamento da equipe frente ao apoio ou crítica da torcida durante um jogo e assim por diante. O Flamengo não precisa copiar o método da Católica, que, aliás, não será adotado nem pelo San Lorenzo. Porém, precisa fazer algo em torno de olhar para o rival, entender suas grandezas e limitações e saber armar-se corretamente para derrota-lo. Ou seja, para vencer na competição, o extracampo é tão fundamental quanto a um elenco de grande qualidade.
Sobre Donatti, Cuellar e Mancuello. Eram titulares absolutos em seus antigos times, porém agora enfrentam dificuldades de se encontrarem no Flamengo. São jogadores com cara de Libertadores? Qual explicação e o que acha deles?
Donatti talvez o grande jogador do Rosário Central, na Libertadores passada. Muitos falavam que Pinola era um zagueiro melhor. Mas “el Pelado” Pinola vinha mal na carreira e só voltou a ganhar nível ao lado de Donatti. Sua capacidade de orientação e de posicionamento e reposicionamento de seus colegas de defesa é rara. Por isso, foi o grande zagueiro do campeonato argentino anterior e um dos melhores da equipe, na Libertadores. Sua capacidade de orientar é fruto também da confiança que seus colegas depositam nele. E tal confiança só existe porque Donatti compra em campo a briga por qualquer jogador. Exemplo: na estreia contra o Nacional, no Gigante de Arroyto, quase todos saíram com a impressão de que Donatti falhara em lances capitais. Contudo, na ocasião, um garoto muito bom, e que não vinha da base do clube, estreava na equipe e não podia falhar diante de 41 mil torcedores. Se alguém puder ver um tape daquele jogo, verá que todas as supostas falhas de Donatti, na prática não foram dele, mas de Gastón Gil Romero. Donatti encobriu todas essas falhas posicionando-se nos lugares certos para que, aos olhos dos outros, ele fosse o vilão. E foi o que aconteceu. Esta é uma grande qualidade deste jogador. Alguns o acusam de lento, mas ele sabe se posicionar e posicionar os seus companheiros nos espaços certos do campo. E algo que poucos se recordam é que o Central atuava lá no campo de ataque, deixando sua defesa exposta. Portanto, ele tem sim a cara de Libertadores. Mancuello, Idem. Cuéllar também possui tal característica, mas bem atrás de seus dois companheiros de equipe. Dos três, Cuéllar é o melhor pelo caráter de sua polivalência. Ou seja, se posicionado em outros setores do campo, não tende a diminuir o tamanho de seu futebol. Claro, muitos irão discordar. Porém, a análise sobre o jogador precisa considerar suas passagens anteriores, pelo Cali e Junior de Barranquilla. Quanto à adaptação isto é bem complicado. Mas asseguro que passa também pela confiança que o jogador sente depositada nele pela comissão técnica. Recém-chegado ao clube e ainda desacreditado, Rafael Vaz teve uma falha grotesca, contra o Fluminense. Zé Ricardo foi mestre em não abandonar o jogador no banco de reservas. E o resultado sabemos qual foi, o zagueiro se tornou um dos melhores da equipe. Já Donatti teve uma infelicidade contra o Figueirense. Porém, o tratamento que recebeu não foi o mesmo. Cuéllar iniciou bem sua participação na equipe ainda dirigida por Muricy. Lembremos: poucas coisas funcionavam naquela equipe. Com Zé Ricardo a equipe pratica um tipo de jogo em que muitas vezes meio-campo e laterais atacam ao mesmo tempo. Defesa fica exposta num corredor aberto pelo centro ou pelos flancos. Então, Marcio Araújo é colocado à frente da defesa. Na prática ele atua como um zagueiro à frente da linha defensiva. Corta bola aqui, corta bola lá, mas apresenta dificuldades extremas de dar um passe de cinco metros. Tudo bem, é a escolha do técnico e eu o respeito pelo seu trabalho no comando da equipe. Porém, se colocasse um zagueiro de verdade na posição não seria melhor? Vem menos ao caso; importa mais é que o técnico e parte da torcida esperam de Cuéllar a mesma coisa. E como ele não faz desse jeito, não serve. Pior que isso é o fato de que Cuéllar não faz da mesma forma que Marcio Araújo porque “não é um primeiro volante”. E o que começa como uma percepção ingênua vira uma verdade. Ora, Cuéllar era um excepcional primeiro volante no Junior de Barraquilla. Por vezes, era segundo também. Sabia marcar, oferecia armação qualificada antes e dentro do grande círculo e muitas vezes chegava à frente para concluir. O fato é que é moderno demais para a posição e Zé Ricardo não quer nada disso. Resultado, também Cuéllar foi para o banco. Portanto, é também por isso que Donatti e Cuéllar encontram dificuldades no clube e estão longe de conseguir uma adaptação satisfatória. Embora eu creia que Mancuello possa entrar mais na equipe, o caso dele é diverso: tem forte concorrência e teve, dentre os três, maiores oportunidades.
Qual sua opinião sobre o trabalho do Zé Ricardo e sua pouca experiência pra disputar logo de cara uma Libertadores. Gosta dele?
Experiência em si pode ajudar, mas não é decisivo. Zé Ricardo representou a melhor decisão possível em termos de substituir Muricy. A direção não concordaria, mas Zé Ricardo mostrou também o quanto Muricy fora uma péssima escolha. Indiscutível que Zé Ricardo encontrou um padrão para a equipe e a fez jogar. Mas a meu ver, o esquema se modificava pouco e se revelou passível de ser encaixado pelas equipes rivais, ao fim da temporada. Um dos aspectos do esquema, previa que o extremo desse combate no lateral ainda no último terço do campo. Desta forma, tanto Jorge quanto Pará/Rodnei deveriam se deparar com o atacante no máximo no um a um, bloqueando a profundidade do jogo rival e obrigando-o a explorar o povoado centro à frente da grande área. Quando a bola então caia neste setor, quem era o primeiro homem a dar o combate? Marcio Araújo. Se o esquema funcionasse bem, este jogador poderia ser Cuéllar, por exemplo. A vantagem, no caso, é que quando o colombiano pegasse a bola, a boa armação da equipe começaria dali, e com qualidade. Porém, o que começou com uma entrega total foi se perdendo com o passar dos jogos. Os extremos apresentavam dificuldades para dar o bote, o que obrigava o lateral a atuar quase como um volante, combatendo ou tentando combater o atacante, que fugia fácil da marcação de extremos como Cirino. Então, mesmo que Jorge se consagrasse, mostrando até um potencial para atuar como volante, o seu cacoete para tal não era dos melhores. Mas se no caso dele as coisas não se complicavam tanto o mesmo não ocorria pelo setor direito da defesa. O fato é que nos dois casos a bola muitas vezes passava solta para o campo de defesa do Flamengo. Quando isto acontecia, a defesa exposta ganhava o reforço de um esforçado zagueiro de corte e que atuava à frente de Réver e Vaz: Marcio Araújo. Ele corria de um lado a outro e muitas vezes fazia o corte. Os olhares que aprovaram a temporada do volante não se deram conta de que talvez um outro alguém com ótima preparação física poderia fazer o mesmo. Se o esquema funcionasse corretamente, Marcio Araújo era desnecessário, e se ele era uma peça necessária num esquema que estava doente, o correto era aplicar a tal esquema uma cura. Nesta hora, o treinador precisa aparecer. E Zé Ricardo não apareceu. E por não aparecer, mostrou limitações que precisam ser consideradas.
Zé Ricardo tem alguns traços dos grandes treinadores. Tem personalidade, pulso firme e banca seu trabalho mesmo diante de possíveis pressões. Digo possíveis pois sei que da direção do clube não parte outra coisa que não seja apoio. Ele tem o comando da equipe e não permite que nenhuma voz descontente ganhe relevo. No entanto, um grande técnico há de ser também um grande gestor de elenco. Não basta tirar um jogador do time e colocá-lo no banco de reservas. Ao fazer isso, o técnico precisa cuidar para que o jogador não vá para o banco inseguro e infeliz. Se isto acontecer, esse jogador poderá se perder completamente. A partir do banco ele dificilmente vai reconstruir sua segurança e autoestima. Quando tiver uma oportunidade, dificilmente atuará bem, pois será presa fácil da pressão das circunstâncias, da necessidade de provar algo para o técnico ou torcida não em quatro ou cinco jogos, mas em 90 minutos etc. Nenhum jogador é santo ou não mereça uma parcela pela queda de seu rendimento, mas também cabe ao técnico uma parcela considerável de tal responsabilidade. E isto fica ainda pior para o técnico, se tal ou tais jogadores apresentavam históricos positivos em seus clubes anteriores, casos principalmente de Cuéllar e Alejandro Donatti. Contudo, acredito que Zé Ricardo possa comandar o Flamengo na Libertadores, desde que faça as necessárias adequações ou readequações na equipe, quando necessário e quando ele, por sua inteligência, perceber o quanto elas serão vitais para que o Rubro-Negro não caia no encaixe da marcação de seus rivais.
O campeonato argentino está em andamento, o San Lorenzo vai estrear na Libertadores já com ritmo de campeonato, mas o cansaço de final de temporada para eles pode pesar. Acha positivo ou negativo?
A questão passa muito pelo caráter do trabalho físico no Ciclón. Poucos sabem, mas o San Lorenzo tem um elenco vastíssimo. Alguns jogadores atuavam pouco. Nesses dias, a mídia tem noticiado as saídas de nomes importantes, como Mas, Blanco, Cauteruccio e outros. Creio que será positivo, pois bons jogadores que já estavam no clube serão forno para o amadurecimento de jovens da base que pedem passagem.
Com a Libertadores durante o ano inteiro, vai criar paralelo com o Brasileiro. Na sua opinião, por acontecer de forma inédita, como os clubes brasileiros deverão trabalhar para disputar fortemente as duas competições?
Sem desespero, com calma, planejamento adequado e, mais que nunca, com a ideia de que bons jogadores são importantes dentro de campo, mas também como forno para os jovens da base. Os elencos precisam se ampliar. Mas grande número de contratações onera os cofres dos clubes.
Assim que o grupo da Libertadores foi divulgado, muitos argentinos temeram o Flamengo, por ter entrado no grupo do San Lorenzo. Mesmo após anos de fracasso na Libertadores o Rubro Negro segue respeitado por sua força. Mas como traduzir isso dentro de campo? O adversário trata mesmo o confronto contra o Flamengo como uma verdadeira final?
Sem dúvida. O tempo inteiro aqui estou falando a partir da perspectiva do Flamengo, daí que só falo das outras equipes. Na perspectiva deles, porém, o Rubro-Negro de fato é assustador. Mas na sua pergunta já há uma resposta. Eles tratam seus jogos contra o Flamengo como uma final, basta ao Rubro-Negro fazer o mesmo. Mas não da boca para fora. Se vão estudar o Flamengo de forma profunda, a esquadra carioca há de fazer o mesmo. No caso do San Lorenzo e Católica há uma conexão significativa das equipes com suas massas torcedoras. Principalmente no caso argentino, os torcedores apoiarão sua equipe mesmo se ela estiver perdendo de goleada. No dia em que um clube brasileiro fizer o mesmo, ou seja criar tal conexão, mesmo em situações adversas, será ainda mais temido dentro de campo pelos rivais da América do Sul.
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