Como sempre, Carlos Eduardo Mansur coloca luzes de forma magistral sobre a forma de jogar do Flamengo.
É elogiável que Barbieri proponha um Flamengo com ideias ofensivas, marcação alta, troca de passes e agressividade. Afinal, quem no futebol brasileiro joga com apenas um volante, sendo este mais passador do que brucutu?
Mas, já dissemos isso aqui no Ninho, é humanamente impossível manter o nível de intensidade que esse esquema exige diante dessa sequência absurda de jogos decisivos.
Lembrando que a saída de Vinicius Jr e a entrada de Vitinho, que fecha mais pelo meio, ainda precisa ser assimilada pela equipe.
O problema? Vitinho chegou após a Copa do Mundo, e Barbieri terá que montar uma nova forma de atacar sem tempo para treinar. Ou seja, trocando a roda com o carro em andamento.
Diante dessa instabilidade, é tentador sim buscar um futebol mais conservador, principalmente quando não puder contar com os três meias e o time não conseguir manter o nível de intensidade, pela maratona de jogos.
Da mesma forma que Barbieri saudou um Flamengo "mutante" no jogo contra o Grêmio no Maracanã que valeu a classificação, porque não busca de imediato uma nova forma de atuar?
Confira na íntegra trecho da coluna publicada em O Globo nessa segunda-feira:
Maurício Barbieri tentou conduzir o Flamengo remando contra a maré vigente no futebol brasileiro. Montou um time com ideias ofensivas, baseado na construção, troca de passes, elaboração. Durante a maratona de agosto, optou por jamais usar onze reservas: descansou gradativamente seus jogadores. A cada partida, duas ou três mudanças, fossem pelos testes que detectam lesões iminentes, ou por lesões ou suspensões.
O resultado é um time que ainda está próximo da liderança do Brasileiro, mas perdeu terreno. Na Copa do Brasil, chegou à semifinal, mas agoniza na Libertadores. Barbieri, cinco meses no cargo, já está sob o julgamento sumário da máquina de moer técnicos.
A verdade é que o time joga pior do que em seus melhores momentos. E, claro, isto tem a ver com problemas próprios do elenco rubro-negro, entre eles a dificuldade de substituir qualquer um de seus meias quando necessário. Mas o roteiro do Flamengo remete ao contexto do futebol no país.
Com um meio-campo leve e técnico para os padrões brasileiros, o Flamengo depende de intensidade para marcar no campo ofensivo. Claro que sentiria a sequência de jogos. Taticamente, a perda de Vinícius Júnior, capaz de abrir o campo pelo lado esquerdo, criou outro obstáculo. Vitinho tende a buscar mais o centro, o que influencia toda a engrenagem ofensiva, o que inclui o meia pelo lado esquerdo — em geral Diego, ontem Paquetá no desastre de Curitiba — e o lateral Rene. Talvez a migração para o 4-4-2 fosse mais conveniente. A questão é mudar a forma de jogar sem tempo para treinar. Não é fácil.
É claro que o Flamengo vive momento de fragilidade, justamente quando a exigência aumentou. E tem um elenco caro demais para sentir tanto. E é fato que Barbieri nem sempre encontrou as respostas. Além disso, pouca coisa justifica um desempenho tão ruim como o dos primeiros 20 minutos no estádio do Atlético-PR. O Flamengo não está fora da disputa do Brasileiro, mas o viés de queda é preocupante e pode ser fatal.
Mas todo o cenário conduz a uma reflexão que excede a realidade rubro-negra. É desafiador reproduzir no Brasil uma prática europeia: a “rotação”, mudando três ou quatro peças a cada jogo. Onde técnicos caem, elencos mudam, onde se joga muito e se treina pouco, é difícil ter um elenco inteiro adaptado ao modelo de jogo. Cada troca de peça é um movimento delicado.
A instabilidade do Flamengo mostra, ainda, como o ambiente nacional é convidativo para que treinadores adotem modelos de jogo mais conservadores. Montar times que busquem trocar passes e criar contra defesas posicionadas atrás é uma construção mais complexa e envolve riscos. Com cargos sempre na berlinda, poucos assumem. Porque raramente a paciência dura tanto quanto o tempo necessário para a maturação de ideias de futebol.
Nos últimos anos, o Campeonato Brasileiro consagrou times de forte marcação, mais pragmáticos. O São Paulo, atual líder, é fortíssimo no contragolpe, assim como o vice-líder Internacional. Ambos são muto competitivos, organizados e eficientes. Mas é natural que jogos contra times fechados lhes criem inconvenientes.
Ontem, contra o fechado Paraná, os gaúchos tiveram a bola. A troca de passes e a criação não é o forte, mas o time esbanja intensidade, presença física no campo rival. Sufocou os paranaenses, mas recorreu a 38 cruzamentos na área e o gol só veio aos aos 51 minutos da etapa final. Contra a Chapecoense, o São Paulo também claudicou quando tentou ter iniciativa, até vencer por 2 a 0, com apenas 45% de posse de bola.
Não há modelo certo ou errado, o preocupante é o futebol brasileiro inibir estilos mais arejados. Aqui, o que impera é a lei da adaptabilidade.
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